Não utilizar as redes sociais é a nova forma de utilizar as redes sociais.
Não utilizar as redes sociais é a nova forma de utilizar as redes sociais.
Bottega Veneta © Getty Images
Bottega Veneta © Getty Images
Numa era cada vez mais digital, há quem esteja a seguir o rumo contrário. Se para cada um de nós desaparecer das redes sociais é motivo de capricho (ou necessidade), para as marcas estamos a falar, antes de tudo, de uma estratégia. Bottega Veneta foi a pioneira, mas já outras empresas da indústria da Moda e da beleza lhe estão a seguir o exemplo.
Começava 2021 quando Bottega Veneta, a prestigiada marca de luxo italiana, disse adeus à sua presença online, ao simultaneamente eliminar as contas de Instagram, Facebook e Twitter. Um apagão total? Segundo François-Henri Pinault, CEO do grupo Kering (o conglomerado que detém a Bottega Veneta, entre outras insígnias de luxo), a estratégia da marca não passa por desaparecer completamente do digital, mas apenas por utilizar as redes sociais “de forma diferente”. Tal estratégia centra-se, então, em colocar a criação de conteúdo nas mãos de quem já o fazia voluntariamente. “A marca decidiu, de acordo o com o seu posicionamento, apoiar-se mais nos seus embaixadores e fãs, dando-lhes os materiais necessários para que possam falar da marca nas diversas redes sociais”, continuou Pinault.
Se para alguns este foi visto como um passo (demasiado) ousado, para outros não foi mais do que uma jogada de marketing. A verdade é que o apagão de Bottega Veneta trouxe numa publicidade maior do que aquela que era conseguida através das publicações diárias no Instagram. E tal como previsto pelo grupo Kering, a marca nunca chegou a desaparecer por completo. Não demorou muito até que um grupo de fãs criasse uma conta no Instagram inteiramente dedicada ao trabalho de Daniel Lee, diretor criativo da marca, cujo sucesso pode ser quantificado pelos mais de 700 mil seguidores que já seguem a curadoria de Laura Nycole.
O segundo grande apagão deu-se na indústria da beleza. A 04 de maio de 2021, a conta de Instagram da marca de cosmética de Kylie Jenner viu todas as suas publicações serem eliminadas, deixando apenas uma foto com a descrição “something is coming”. Esta seria a forma que o elemento mais novo do clã Kardashian-Jenner encontraria para apresentar a sua nova coleção de lip kits. E sem dúvida que o hype que a marca procurava construir compensou, pois, em poucos minutos, a foto que funcionava como teaser para o lançamento dos novos produtos bateu recordes em números de likes e comentários.
Dois é coincidência, mas três já é tendência. Voltamos agora à Moda para falar do mais recente caso de utilização, digamos, bizarra de redes sociais. 53 anos após Cristóbal Balenciaga ter fechado o seu atelier, a célebre marca de luxo que criou, agora nas mãos de Demna Gvasalia, apresentou uma coleção de haute couture que viria a dar que falar não somente pelas suas peças, mas pela introdução que trouxe à comunicação da marca. Seguindo o exemplo de Kylie Jenner, a conta de Instagram de Balenciaga sofreu uma limpeza total e, durante dias, esteve reduzida a zero publicações. Apenas quando as peças de Alta-Costura foram apresentadas, no dia 7 de julho, é que a marca fez as primeiras partilhas junto do público digital. Todavia, não estaríamos a falar de Balenciaga se não houvesse um twist. É que a marca não eliminou as suas publicações apenas uma vez, mas tem sim vindo a fazê-lo repetidamente desde então. Sempre que um novo conjunto de fotografias é partilhado na sua conta de Instagram, as restantes são apagadas (ou arquivadas, já aí chegaremos), dando-lhes um caráter de efemeridade a que não estávamos habituados.
Provas apresentadas, há agora que responder à grande questão: será esta a jogada acertada? No caso de Bottega Veneta, François-Henri Pinault já veio dizer que a decisão de abandonar as redes sociais tem-se mostrado “bastante convincente para a visibilidade da marca”, concluindo que o caso “está a ser bastante monitorizado”. Desde que as contas foram eliminadas, Daniel Lee criou um jornal digital, onde a partilha sazonal de conteúdos audiovisuais veio, de certa forma, preencher o vazio na comunicação da marca. Se bem que, para as marcas de luxo, que vivem do mistério e da exclusividade, também os “vazios” tendem a ter resultados bastante favoráveis. Basta relembrar Martin Margiela, cuja recusa em responder a entrevistas ou aparecer em fotos fazia da icónica figura da indústria da Moda uma personagem ainda mais célebre. Ou a era de Céline com Phoebe Philo, pois mesmo sendo uma das últimas grandes maisons a juntar-se ao mundo digital, isso em nada prejudicou a sua popularidade.
Maison Martin Margiela © Getty Images
Maison Martin Margiela © Getty Images
Em muito contribuíram as redes sociais para a democratização das marcas de luxo. Todavia, enquanto consumidores, não nos podemos esquecer de que ter acesso a imagens e informação de uma marca não significa automaticamente que os seus produtos sejam acessíveis. E talvez seja isso que Demna Gvasalia nos está a tentar transmitir através da forma como partilha conteúdo nas plataformas digitais. Ou talvez não. Tanto Gvasalia como Lee já tinham previamente mostrado em entrevistas o seu descrédito face ao valor das redes sociais. Nas palavras do diretor criativo da Bottega Veneta, a utilização em demasia destas plataformas “pode ser perigosa e prejudicial para o processo criativo”.
Seja qual for o caminho adotado - o apagão total de Bottega Veneta ou a efemeridade das publicações de Balenciaga - é importante relembrar que nenhuma destas ações tem de ter um caráter definitivo. A marca de Daniel Lee poderá sempre reativar as suas contas nas diversas plataformas digitais, enquanto nada nos diz que as publicações da Kylie Cosmetics ou da Balenciaga não possam estar somente arquivadas. Tendo em conta que não existe nenhuma funcionalidade no Instagram que permita eliminar todas as publicações em conjunto, ter de fazê-lo fotografia a fotografia retira qualquer impulsividade que poderia estar presente na ação. Mesmo sabendo que, quando falamos da indústria da Moda e da beleza, até os acasos são planeados.
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