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Até já, Dead Combo

26 Nov 2019
By Patrícia Torres

“Para nós, 2020 não será um ano qualquer”.

“Para nós, 2020 não será um ano qualquer”.

Dead Combo © Daniel Costa Neves
Dead Combo © Daniel Costa Neves

Para nós também não. Após 18 anos a musicar a ideia de uma certa Lisboa, transformando-se na sua mais excecional e criativa banda sonora, os Dead Combo anunciaram, em outubro deste ano, o seu fim. “Se o nosso encontro foi uma descoberta, uma grande amizade, um diálogo musical, um universo que se foi adensando e clarificando; se todos estes anos foram uma grande festa nas nossas vidas, não poderia ser de outra forma o nosso final. Decidimos acabar, mas acabar em grande”, escreveu a dupla Tó Trips e Pedro Gonçalves em comunicado. 

Estávamos em 2003 quando a paisagem de Lisboa se alterou para sempre. Trips na guitarra, Gonçalves no contrabaixo (ao qual se juntou muitas vezes uma melódica e um kazoo), descodificaram a sonoridade que há muito tempo ecoava pelos bairros lisboetas sem que nunca ninguém a tivesse conseguido traduzir de forma tão genuína, quanto moderna. O primeiro álbum, Vol.1, chegou com estrondo. A crítica nacional aplaudiu de pé, a internacional rendeu-se. Charlie Gillett (1942-2010), musicólogo e radialista britânico, elegeu Vol.1 como um dos melhores álbuns de 2004. Nos anos seguintes, depois da estreia promissora, os Dead Combo foram confirmando as (nossas) expectativas ao longo de mais seis registos discográficos: Vol.2 - Quando a Alma Não é Pequena, Guitars from Nothing, Luisitânia Playboys, Lisboa Mulata, A Bunch of Meninos. Em 2018, Odeon Hotel, remata o percurso, mas não dita o fim, porque os Dead Combo ainda vão andar por aí, numa tour que será, como dizem os próprios, “um passeio pela nossa história.”

Uma história que está intimamente ligada à deslizante calçada portuguesa, ao som da guitarra de Carlos Paredes, à flauta do amolador de facas ou ao frenesim dos putos a roubar maças (título de uma música do álbum Lusitânia Playboys). Foi em abril deste ano que a banda, em entrevista ao site Comunidade Cultura e Arte, confirmava a relação especial que os liga à capital portuguesa. “Os nosso discos estão sempre em sintonia com a cidade de Lisboa. Este álbum, Odeon Hotel, tem a ver com a gentrificação da cidade. É o disco mais eclético, mais rock, talvez o disco menos português dos Dead Combo. Somos nós numa outra Lisboa. Uma Lisboa do final da segunda década do século XXI.” Para este disco os Combo foram buscar o produtor Alain Johannes – habituado a colaborar com bandas como PJ Harvey, Queen of The Stone Age ou Chris Cornell – e Mark Lanegan, cantor americano que apareceu a cantar ao vivo com a banda, este ano, no festival Paredes de Coura. 

Há uma Lisboa antes e depois dos Dead Combo. Ou há, pelo menos, um desenho musical dessa Lisboa que serve o imaginário dos de cá, mas também, ou especialmente, dos que sobre nós não sabem nada. Em 2013, o famoso chef e apresentador do programa No Reservations, Anthony Bourdain, já falecido, faz o roteiro gastronómico lisboeta ao som dos Dead Combo. Lá fora, quem descobre o que é uma bifana fica a saber a que é que sabem os Dead Combo. Agora, com este anúncio, o sabor é agridoce. “Não é um final triste, há muita coisa para celebrar”, dizem eles a acenar, enquanto marcamos na agenda as datas dos próximos espetáculos. E enquanto esses não chegam à capital, ligamos a televisão para os ouvir na série policial Sul (RTP1), cuja banda sonora colora a tal ideia de uma certa Lisboa. A mesma onde seremos para sempre só a bunch of meninos. Até já, Dead Combo. 

Artigo originalmente publicado na edição de novembro de 2019 da Vogue Portugal.

Patrícia Torres By Patrícia Torres

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