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Desglobalização: de olhos postos nos pequenos negócios

09 Apr 2021
By Mathilde Misciagna

O futuro das marcas de Moda não é a quantidade de produtos, mas a relevância das suas propostas.

O futuro das marcas de Moda não é a quantidade de produtos, mas a relevância das suas propostas.

Fotografia de Noémi Ottilia Szabo. Realização de Lyla Cheng. Vogue Portugal, Setembro 2019

Ser proprietário de um pequeno negócio independente é difícil. Sê-lo durante uma pandemia é no mínimo assustador. Indústrias dominadas por mulheres, como o setor do retalho, hotelaria e beleza foram profundamente afetadas pela crise sanitária, com consequências desastrosas para muitas mulheres. Apesar disso, negócios liderados por mulheres corajosas e dedicadas florescem por essa internet fora. E dão a volta por cima nestes tempos fora do comum, com todas as ferramentas que têm à disposição.

Inspiração não lhes falta. Tecidos sustentáveis, designs intemporais, made-to-order e por medida, produções em pequena escala e locais, transparência e preços justos para quem produz e para quem compra são algumas das características de uma série de marcas com selo nacional. Comprar local significa também alimentar o sonho de alguém, o que não deixa de ser uma forma romântica de fundamentar um add to chart. Mas além disso, estas são marcas sustentáveis. Uma palavra muito usada (cada vez mais irresponsavelmente basta pensar no greenwashing), mas será que compreendemos o seu verdadeiro significado? O mercado impôs-nos uma cor, palavras e texturas para sermos levados a consumir de forma mais “leve” e de consciência tranquila e é importante desconstruir para tomar uma decisão de compra informada e não apenas vaga.

Sustentabilidade não é uma tendência e não tem a ver só com matéria-prima. Pode ser sustentável produzir em Portugal ou no Bangladesh, desde que se conheça o impacto real e todo o processo ao pormenor. “Não compramos sustentabilidade (ainda), compramos peças bonitas e se forem sustentáveis é um upgrade positivo”, escreve a consultora de comunicação Joana Campos Silva no artigo A sustentabilidade do vestuário. E acrescenta: “Se hoje em dia o produto não proteger a saúde humana e o ambiente ele é considerado um produto obsoleto.” 

Com uma qualidade superior e durável, utilizando maioritariamente tecidos reciclados ou deadstock em quantidades muito limitadas de forma a garantir que a produção tem o menor impacto possível no planeta. Sabendo que reduzir o impacto não é eliminar o impacto, talvez mais do que sustentáveis, a palavra certa para estas marcas será responsáveis (e isso significa mais seguras para o ambiente e para as pessoas). Mas uma marca de Moda sustentável também implica que seja possível rastrear o produto desde a colheita da matéria-prima, à sua transformação, até à compra. No fundo, uma marca sustentável é uma marca honesta e com um propósito. Não necessariamente educativa ou moralista, mas verdadeira na mensagem e nas ações. 

A missão destas marcas é dar-nos peças que resistam com a passagem dos anos, representem momentos, lugares e quem sabe até pessoas, e mais tarde possam ser herdadas. Parece uma missão exigente, mas não é. É o tempo que faz com que as coisas que tornem importantes. Loved clothes last (prolongar a vida das peças e protegê-las), descreve o motto do Fashion Revolution. Negócios orientados para a comunidade e com uma relação muito próxima entre proprietário e cliente são o futuro do retalho. E embora possa parecer um momento estranho para fazer compras, é importante compreender que também é um momento estranho para as marcas tentarem vender-nos coisas, mas que essas compras neste caso apoiam pequenas empresas e não grandes corporações (que provavelmente têm recursos/fundos de maneio disponíveis para circunstâncias como esta).

Depois da globalização, surge a tendência de voltar “ao início”: produzir “em casa” ou perto “de casa”, garantindo os fornecimentos e reduzindo riscos. O made in Portugal sempre precisou de nós, sempre precisará de nós e do nosso apoio. Moda e compras não são apenas roupa, também são pessoas, empregos e subsistência. Também são identidade, autoexpressão e autoestima de quem compra, que são ainda mais importantes durante uma crise de tal ordem como esta. Ou pelo menos fornecem um alívio necessário no meio de tanta tensão. Posto isto, as redes sociais podem ser uma boa ferramenta para apoiar estes negócios, através de gostos, comentários e partilhas – caso a compra não seja uma opção. Esta é uma nova forma de consumir (com menos desperdício e um produto mais ajustado às nossas necessidades), de viver nesta sociedade “consciente” das necessidades ambientais e humanas mas precária nos métodos para as atingir. 

O que se faz com as mãos não tem preço e a criatividade só pertence ao ser humano. A nossa compra tem um potencial transformador (para nós e para uma marca), pelo que devemos comprar com intenção. Deixamo-la com esta(s opções).

Mathilde Misciagna By Mathilde Misciagna

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