Ilustração © Florent Stosskopf
“Ninguém é super-homem o suficiente para escapar completamente ao kitsch... Não importa o quanto o desprezemos, ele é uma parte integral da condição humana.” - Milan Kundera
KITSCH PLEASE!
Avery Richardson
Jamie Nelson
Ninguém sabe ao certo como nasceu a palavra kitsch, embora tudo indique que tenha sido na Alemanha, no final do século XIX. Sobretudo, ninguém sabe muito bem como definir a palavra. Mas todos reconhecemos o kitsch quando nos deparamos com ele. Ele está presente nas mais variadas formas artísticas (ou anti-artísticas) que nos rodeiam e entranhado no prazer de tantas das nossas memórias de infância e adolescência. E essas memórias acabam por ser coletivas, em cada geração.
Nasci nos anos 70 e a minha adolescência atravessou a década de 80, períodos particularmente ricos, e loucos, em referências kitsch e em muito plástico. Dos padrões psicadélicos e gritantes dos papéis de parede aos azulejos que forravam as casas mais trendy na época e aos excessos decorativos na moda, um look que primasse pela simplicidade parecia não estar completo enquanto não fosse poluído com uma bijuteria grande e ruidosa - e se fosse em plástico e cores néon, tanto melhor. Os excessos de botões, fechos ou outros complementos completamente desnecessários e com pretensões meramente decorativas eram rematados com a cereja no topo dos ombros: enchumaços absurdamente desproporcionados (especialmente para alguém com pouco mais de metro e meio, como eu). Quase tudo registado em fotos, que a minha geração passou os anos 90 e 2000 a querer esconder, como se uma noção de gosto pelo design depurado e pela simplicidade tivessem feito parte das nossas escolhas desde sempre.
Nyaueth Riam
Pierfrancesco Artini
Nesta edição, prestamos uma homenagem ao kitsch, ao seu lado lúdico e naif, e deixámos on hold conceitos como bom gosto, elegância, sofisticação ou subtileza. Brincamos com a estética mais julgada, criticada e desprezada de sempre, ao longo das páginas que se seguem, e que atire a primeira pedra quem nunca pecou, não tem um esqueleto no armário ou um guilty pleasure kitsch, seja ele uma música, um boneco "fofinho" ou aquela peça de roupa "foleira" ou excessiva, mas que nos foi (ou ainda é) irresistível.
Ironicamente, se por um lado o kitsch é acusado de ser fake, ele pode ser o fake mais genuíno e verdadeiro, mais do que muitos “originais” pretensiosos e tão pouco honestos nas emoções que nos definem como seres humanos.
Luz Pavon
Pierre et Gilles
Originalmente publicado no The Kitsch Issue, de fevereiro 2024. For the English Version, click here.