@vibram via Instagram
A Balenciaga revelou umas novas sandálias de sola fina, em pleno auge da obsessão da Moda com os sapatos “barefoot”.
Em dezembro, quando a Balenciaga lançou o seu lookbook primavera/verão 2025, foi notório que algo estava a acontecer. Muitas das modelos estavam a usar o que parecia ser uma palmilha fina, quase invisível a olho nu, apenas presa pelo dedo grande do pé.
As Zero são as sandálias ultraleves da Balenciaga, moldadas em 3D e barefoot (descalça), que a marca diz “destilar o calçado até à sua essência”. O preço de venda será de 350 euros. Os comentários ao post de Demnagram (Instagram apoiado pela Balenciaga) sobre os sapatos oscilaram entre o positivo (“Seja o que isto for, quero-o”) e o incrédulo (“a que estão a brincar?”). A marca não quis comentar a reação.
Ame-os ou odeie-os, os sapatos barefoot estão a tornar-se num grande sucesso. Na sua forma mais prática, estes sapatos são pensados para reforçar o contacto entre o pé e o solo e permitir espaço para os dedos se moverem. Com marcas como a Vibram FiveFingers e a Vivobarefoot a surgirem, o mercado deste tipo de calçado deverá atingir quase 800 milhões de dólares até 2031, segundo a Allied Market Research, um aumento de 40% em relação à sua dimensão atual. E está a influenciar o setor do calçado em geral: desde os sapatos de pata de JW Anderson aos sapatos macios de biqueira quadrada de Phoebe Philo, as propostas de sapatos de sola fina e larga, ou sapatos que expõem os dedos dos pés, são cada vez mais recorrentes.
Do Tabi ao sapato de dedo do pé: o nascimento dos sapatos barefoot
A tendência dos “pés descalços” começou a florescer há algum tempo: a Balenciaga colaborou com a Vibram FiveFingers (cujos sapatos se dividem entre cada dedo do pé como uma luva) para criar uma versão com salto em 2020.
Originalmente criados para escalada e atividades ao ar livre, os FiveFingers passaram de um calçado de nicho, popular principalmente entre os homens que procuravam um melhor desempenho desportivo, para uma marca que atrai o público da Moda com uma percentagem de consumidores feminina em crescimento. “Quando entrei para a empresa, as mulheres na Europa e nos EUA nunca usariam FiveFingers. É um produto que divide opiniões”, afirma Carmen Marani, diretora global da FiveFingers. “Esteticamente, não era fácil andar com os dedos dos pés à vista, o que constituía uma barreira [de adesão] para a maioria dos consumidores. Agora as coisas estão a mudar. Agora, os dedos dos pés são algo que temos de mostrar”.
As sandálias Zero da Balenciaga estarão à venda por € 350, segundo a marca.
Cortesia Balenciaga
Nos últimos dois anos, a FiveFingers registou um aumento nas encomendas de lojas de Alta-Costura. Em 2023, a marca colaborou com a japonesa Suicoke, disponível em espaços como Dover Street Market (globalmente) e Slam Jam. Para a primavera/verão 2025, a Vibram FiveFingers será lançada em várias lojas, incluindo a Naked, em Copenhaga, a Ssense e outros que ainda não “formalizaram o acordo”.
A difusão mais alargada deste estilo pode ser associada aos Tabis de biqueira bipartida, da Margiela, que tiveram um grande impacto nos últimos anos, incentivando as pessoas para outros formatos de calçado vanguardistas (todos os especialistas entrevistados para este artigo referiram os Tabi como um antecessor do calçado barefoot). Agora, os mais antigos adeptos dos sapatos Tabi estão à procura da próxima grande novidade. “No passado, vimos designs que incluíam os dedos dos pés de Schiaparelli, Margiela, Loewe e Celine... O [FiveFingers] é simplesmente mais um sapato para as pessoas se separarem do grupo Tabi, que se tornou normal nos círculos da Moda”, diz a escritora nova-iorquina e alum da Vogue, Liana Satenstein, que, através da sua newsletter Neverworns, se tornou uma espécie de correspondente de sapatos barefoot nos últimos meses.
Satenstein e a escritora britânica Georgia Graham, fundadora do podcast de estilo e da newsletter Threads of Conversation, afirmam que foram induzidas a comprar sapatos barefoot pela influenciadora francesa Melissa Bon. Graham também se recorda de ter visto os FiveFingers na passerelle de outono/inverno 2024 da designer de Berlin Marie Lueder.
Cortesia Georgia Graham
“A Moda precisa sempre de brincar com algo entusiasmante, e os dedos dos pés são a nova tendência. Há também toda uma conversa sobre ‘tocar na relva’ [passar tempo ao ar livre e desligar-se da tecnologia], por isso, talvez tocar na relva (ou no cimento) através dos sapatos mais finos que consigamos usar seja uma resposta a isto”, diz Graham. “Penso que a tendência [sapatos barefoot] reúne a preocupação atual da Moda com os pés, mas também a tendência gorp e o gosto atual por sapatos de borracha (como os Crocs, etc.). Está a tornar-se um sucesso porque incorpora diferentes tendências num só sapato”.
Benefícios para a saúde e bem-estar
Para lá da Moda, muitas pessoas estão a usar sapatos barefoot por motivos de saúde ao invés de estética. Asher e Galahad Clark (membros da sétima geração da família dona da Clarks) fundaram a marca de ténis barefoot Vivobarefoot, com sede no Reino Unido, em 2010, após descobrirem os benefícios deste tipo de calçado para a saúde, que inclui uma melhoria da postura e a redução de lesões.
“Milhões de anos de evolução fizeram um trabalho fantástico. E aqui estamos nós, como fabricantes de calçado, a regressar a isso”, diz Asher. “Durante 30 anos, as marcas de calçado mais sexy do mundo venderam tecnologia para os pés grande, volumosa e com amortecimento, quando, na verdade, os pés têm toda a tecnologia que precisam, e tudo o que precisamos de fazer é sair do caminho”.
A Vivobarefoot é especializada em ténis de sola “descalça” larga e fina (sem divisões nos dedos) para o dia a dia ou para a prática de desporto. A marca vendeu 1 milhão de pares de ténis barefoot em 2023, com um aumento de 25% nas vendas em relação ao ano anterior. Ao falar sobre a marca, um membro da Geração Z da equipa da Vogue Business revelou que comprou recentemente um par (que custa 90 libras) após um TikToker ter dito que eram bons para levantar pesos devido a sentirmo-nos mais estáveis e assentos no chão.
A Vivobarefoot vendeu 1 milhão de pares de sapatos em 2023.
Fotografia: Vivobarefoot
Clark vê a Vivobarefoot como uma das muitas marcas que estão a explorar o crescente movimento de bem-estar, à medida que as pessoas procuram otimizar todos os aspetos da sua saúde, desde o sono à nutrição e exercício. “Todas estas coisas estão relacionadas com o facto de nos sentirmos um pouco mais humanos, mais presentes. Vivobarefoot é a solução abaixo do tornozelo para a mentalidade de saúde natural”.
Irá durar?
Os Vivobarefoots têm um aspeto um pouco diferente dos Zero, mas, mesmo assim, a assinatura de Demna é, por vezes, impactante no que diz respeito à silhueta. O designer foi um dos primeiros defensores dos ténis chunky quando os ténis XXL da Balenciaga, os Triple S, surgiram em 2017. Sem dúvida, o modelo foi um antecessor das solas volumosas que vemos no mundo dos ténis atual, desde os Cloud Monster da On ou os Hoka Ones. “Só há um caminho a seguir quando se está em cima e esse caminho é para baixo, certo? Por isso, prevejo uma mudança para [os sapatos barefoot]”, diz Clark. “E, obviamente, essa mudança será apoiada por iniciativas como a de Demna”.
“Penso que estamos definitivamente a assistir ao regresso de um calçado mais delicado, o que coincide com a tendência FiveFinger”, concorda Graham. “Se as botas [vermelhas e grandes] Mschf foram o auge do calçado gigante, agora estamos a descer o outro lado da montanha”. É possível ver esta tendência no mundo dos ténis, acrescenta, onde os ténis low-profile como os Puma Mostro, Speedcats e os Adidas Taekwondo estão a tornar-se mais populares.
Como já vimos anteriormente, as tendências das silhuetas de calçado vão e vêm. Mesmo ténis como os Jordan ou os Dunks acabaram por cair em desuso, após décadas de procura. Será que as marcas de calçado barefoot estão preocupadas com o facto desta tendência ser efémera?
“Penso que a tendência [barefoot] vai continuar a crescer, mas se vão manter-se cool ou não é outra questão. Hoje em dia, as pessoas aderem tão rapidamente às tendências que o apelo de um nicho pode ser facilmente esmagado pelo mainstream”, diz Graham. “Continuo a adorar os meus FiveFingers e são super confortáveis, por isso, compraria outro par. Mas vou usá-los menos se se tornarem demasiado banais. Acho que esse é o verdadeiro desafio da Vibram, agora que os sapatos estão a ganhar popularidade. Como é que podem garantir que o hype se mantém?”
Marani está consciente dos riscos do ciclo de tendências, mas confiante nos benefícios não estéticos da FiveFingers. “Não oferecemos produtos, por isso os influenciadores que usam FiveFingers compraram por vontade própria”, afirma. “É uma verdadeira mudança de vida, a forma como se sentem, sem os dedos dos pés esmagados e sobrepostos. É isto que estamos a tentar fazer enquanto marca. Queremos aproveitar a tendência, mas, ao mesmo tempo, queremos continuar a concentrar-nos no desempenho e garantir que as pessoas compreendem o objetivo do produto”.
Quanto ao par da Balenciaga, a marca confirmou que as sandálias Zero estarão à venda na estação primavera/verão 2025. “Os Zero parecem mais uns sapatos conceptuais do que algo prático que se possa usar muitas vezes”, diz Graham. “Mas ainda não as experimentei, por isso talvez também sejam muito funcionais? Com os Vibrams, os sapatos nascem de uma questão prática – eram pensados para as pessoas que gostam de andar ao ar livre antes dos apaixonados pela Moda os usarem. Por isso, penso que a génese do estilo é diferente, mesmo que ambos pertençam à família dos pés da Moda”.
“O meu vizinho de cima, que trabalha no design de calçado, enviou-me uma DM depois de me ter visto publicar os [Zero] nos stories e disse-me que são incríveis do ponto de vista da engenharia. E são mesmo. Estão pendurados por uma espiral no dedo do pé!”, diz Satenstein. “Talvez, comercialmente, o produzam com cobertura total? Nesse caso, acho que os Zero têm pernas – ou melhor, pés – para andar”.
Traduzido do original, disponível aqui.