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Não és tu, sou eu: o guia para superar a rejeição

13 Feb 2019
By Mónica Bozinoski

Ouvir um não pode ser sempre garantido, mas essa certeza não serve de consolo quando a rejeição nos bate à porta. A Vogue conversou com dois especialistas para tentar decifrar as melhores formas de sarar as cicatrizes de um ego ferido.

Ouvir um não pode ser sempre garantido, mas essa certeza não serve de consolo quando a rejeição nos bate à porta. A Vogue conversou com dois especialistas para tentar decifrar as melhores formas de sarar as cicatrizes de um ego ferido.  

© Kourken Pakchanian; Condénast Archive

Vamos começar por colocar todas as cartas em cima da mesa. Não existe ninguém neste mundo que goste de ser rejeitado, da mesma forma que não existe ninguém neste mundo que nunca tenha experienciado aquele que é, talvez, o pontapé mais doloroso que um ego pode sentir. Sim, a rejeição é horrível – mas é algo que vai acontecer a todos nós, quer queiramos, quer não. Mais do que isso, como nos explica Filipa Jardim da Silva, psicóloga clínica e coach profissional, “é a ferida emocional mais comum que mantemos nas nossas vidas”. Mas porque é que isto tem que nos acontecer? A resposta está no, não tão simples, facto de a rejeição estar “diretamente ligada a algumas das principais necessidades humanas, a necessidade de reconhecimento e a necessidade de ligação ao outro”, diz Sérgio Oliveira, master trainer de Programação Neurolinguística (PNL), Time Line Theraphy e Hipnose. “Uma pessoa que se sente rejeitada não se sente reconhecida ou ligada aos outros, e isso afeta-nos porque faz parte da nossa condição humana.”

Como defende Filipa, “hoje, e graças à aldeia global em que vivemos, por entre todas as redes sociais e apps, cada um de nós liga-se a milhares de pessoas, qualquer uma com o poder de ignorar uma publicação nossa, uma mensagem, ou até de nos dirigir um comentário depreciativo, gerando em nós uma sensação de rejeição.” O que é que isto significa? Que ninguém está isento de sentir os efeitos do “não” na pele – mesmo aqueles que se dizem completamente desligados e indiferentes a este novo clima social. “A par destas rejeições menores, ainda estamos vulneráveis a rejeições mais severas, como o término de relações amorosas significativas, despedimentos, desprezo ou traição de amigos, abandono por familiares ou ostracização pela comunidade em que estamos inseridos”, explica Filipa, que faz ainda a ressalva de que, “independentemente da escala", a rejeição "é sempre penosa.”

Mas porque é que a rejeição e todos os sentimentos que a ela se associam – entre eles a culpabilização, a desvalorização e o isolamento, como refere Sérgio Oliveira -, nos afetam de uma forma tão profunda e dolorosa? “A resposta está nos cérebros, que estão programados para responder desta maneira”, explica Filipa. “Quando investigadores colocaram pessoas em equipamentos de ressonância magnética e lhes pediram para recordar uma rejeição recente, descobriram que as áreas do nosso cérebro que ficam ativadas quando experienciamos rejeição são as mesmas de quando sentimos dor física.” Como refere a especialista, “alguns psicólogos acreditam que isto se deve a uma necessidade adaptativa” – “nos tempos antepassados, ser-se rejeitado significava estar em perigo”, o que significa que “a dor sinalizava esse mesmo perigo, que nos levava a reenquadrar e a procurar criar laços que nos garantissem integração e proteção.”

“O medo de rejeição, em alguma medida, é natural e compreensível. Todavia, se alimentado, pode tornar-se o maior obstáculo à concretização do nosso maior potencial.” 

Se é verdade que a rejeição faz parte daquilo que somos enquanto seres humanos, é igualmente verdade que cada um de nós vai reagir de forma diferente à recusa de uma relação amorosa ou de um emprego de sonho. “Há quem reaja com agressividade e hostilidade para com o outro, numa tentativa de diminuir a fonte de dor”, explica Filipa sobre um dos três tipos de reação. Segundo a especialista, também “há quem se vire contra si mesmo, personalizando totalmente a rejeição e colocando em causa o seu valor pessoal, numa espiral de desvalorização”, e “quem fique de tal modo magoado que se isola, desenvolvendo dificuldade em ligar-se aos outros e expor-se socialmente, numa tentativa de evitar uma dor semelhante.”

Quem passou por ela sabe precisamente aquilo a que Filipa se refere, e decerto já terá sentido o perigoso chamamento do fantasma do “não” – ou, nas palavras de Sérgio, “o medo de não sermos aceites pelos outros, de não estarmos à altura das expectativas, de não sermos bons o suficiente”, e de evitarmos a todo o custo situações que possam levar a tal. Os perigos, como nos diz Filipa, passam por “perdermos novas oportunidades; ficarmos reféns de uma tentativa permanente de agradar a toda a gente, dizendo que sim a tudo e todos e anulando a nossa identidade; criarmos uma máscara social muito diferente do nosso verdadeiro eu; evitarmos a visibilidade, em qualquer contexto; e adotarmos uma postura passivo-agressiva, como forma de defesa”. Para Sérgio Oliveira, as consequências destes sentimentos repetidos e constantes não criam apenas consequências profundas a nível dos relacionamentos e da carreira, mas também da saúde – como salienta o master trainer, “um corpo cujos órgãos estão constantemente a ser nutridos com emoções de medo, tristeza e culpa, dificilmente poderá funcionar de forma plena e saudável”.

O copo meio cheio, ou como lidar com a rejeição 

Por esta altura, não precisamos de dizer que cicatrizar as feridas deixadas por uma rejeição é um processo emocional e fisicamente desgastante – até porque, por esta altura, é provável que todos nós já tenhamos passado por isso. Aquilo que precisamos de dizer (ou melhor, transmitir), é que dificuldade e impossibilidade não andam de mãos dadas.   

“De um ponto de vista cognitivo, podemos recear que a rejeição confirme o pior dos nossos medos: que não somos suficientemente bons, que não comos capazes de suscitar o amor ou o interesse dos outros, que estamos destinados a ficar sozinhos”, explica Filipa. Como ressalva a psicóloga clínica, é importante “identificar estes pensamentos e colocá-los na nossa mira de atenção para então os desconstruir, na medida em que são apenas pensamentos” – e, no caso especifico da rejeição, “pensamentos negativos e intimidatórios, que podemos escolher não alimentar”.

Para Sérgio, a palavra de ordem para superar uma rejeição é a gratidão – uma arma poderosa que, segundo o master trainer, “as pessoas desconhecem ou subestimam”. Na opinião do especialista, é essencial que as pessoas se concentrem naquilo que têm, e que se sintam gratas por isso. Sobre a rejeição, Sérgio diz ainda que “gostaria que as pessoas compreendessem que, se há algo que não podemos controlar na vida, é a opinião que os outros têm sobre nós. Por mais que nos esforcemos, por mais que façamos por agradar aos outros, isso não é necessariamente sinónimo de que elas irão gostar de nós”. A sugestão do especialista? “Agrade-se a si mesma, pois é consigo que irá viver toda a vida. Goste de si em primeiro lugar, encha-se de amor-próprio, pois não é possível darmos algo que não temos. A experiência diz-me que isto resulta.”

O amor-próprio é algo que Filipa também defende como essencial. “Neste processo de aprender a lidar com a rejeição, um dos passos fundamentais é também desenvolver-se uma atitude mais consciente e sintonizada connosco mesmos, sem autojulgamentos, com mais capacidade de nos relacionarmos com todas as emoções enquanto necessárias e potencialmente produtivas, sem as rotularmos como boas ou más”, diz-nos a especialista. “Muitas vezes, a perceção de rejeição exterior é apenas um eco de uma autocritica permanente”, explica a psicóloga, que prefere uma abordagem de “aprender com o que nos dói, e ir crescendo com essa dor” – até porque, como explica Filipa, “os episódios de rejeição podem dar-nos a conhecer parte de nós mesmos, podem ajudar-nos a melhorar as nossas relações interpessoais, podem apoiar-nos a lidar melhor com o desconforto inerente à experiência humana.”

O guia prático para cicatrizar o ego 

Como defende Filipa, “mesmo sendo difícil lidar com algumas situações de rejeição, especialmente quando são frequentes e intensas, um conjunto de boas práticas poderá apoiar”. Estes são os seis conselhos da especialista para lidar com o “não” de uma forma mais positiva: 

1. Reconhecer a situação e aceitá-la enquanto dolorosa. A rejeição é uma experiência que faz parte da vida e é natural existir dor associada;

2. Permita-se dar nome ao que sente. Nomear as suas emoções, quer seja por escrito, quer seja em voz alta, para si mesmo e para os outros, ajuda a clarificar o que aconteceu e a forma como está a ser vivido;

3. Evite reviver o evento e ficar num loop mental em torno do que aconteceu, uma vez que poderá alimentar a auto-culpabilização e dificultar o processo de seguir em frente;

4. Utilize informação isenta que o ajude a compreender e a contextualizar a situação de rejeição. Evite personalizar a rejeição ou confundir pensamentos e opiniões com factos;

5. Mobilize a sua rede de suporte de confiança. Interações positivas com amigos e familiares tenderão a gerar uma diminuição da dor;

6. Pratique atividade física, uma vez que o exercício tende a libertar endorfinas que ajudam no alívio da dor.

Mónica Bozinoski By Mónica Bozinoski

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