São mulheres, músicas, atrizes, modelos, ativistas. São agentes de mudança determinadas a moldar o nosso futuro. Para melhor. Este é o perfil de Janelle Monáe.
São mulheres, músicas, atrizes, modelos, ativistas. São agentes de mudança determinadas a moldar o nosso futuro. Para melhor. Este é o perfil de Janelle Monáe.
© Getty Images.
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“Pink like the walls and the doors, maybe (deep inside, we're all just pink)”. Se nunca ouviu Janelle Monáe e está a ler isto, tem autorização expressa para se afastar do Vogue.pt uns segundos para escutar uma música da cantora e ativista norte-americana. A ter de escolher só uma, que seja Pynk, que inclui os versos atrás referidos e que é uma verdadeira ode às vaginas. A cantora, que cresceu no seio de uma família cristã em Kansas City, ressurgiu no panorama musical em 2018, com esta faixa fruto de uma parceria com a canadiana Grimes. “Pynk é uma celebração garrida da criação, amor próprio, sexualidade, e pussy power! Pynk é a cor que nos une a todos, pois o cor-de-rosa é a cor encontrada nos mais profundos e escuros recantos humanos em toda a parte. Pynk é onde o futuro nasce”, lê-se na descrição do vídeo que viria a tornar-se absolutamente viral, não só pelo figurino — onde está um vestido do criador David Ferreira —, mas pela mensagem subliminar.
A luta pelo empoderamento feminino (e não só) tem sido um tema indissociável do trabalho de Janelle — tanto na música como nas outras indústrias em que a artista se move, como o cinema, no qual trabalha frequentemente enquanto atriz. Já em 2016, antes sequer do movimento #MeToo ou Time’s Up surgirem, a artista criara a organização Fem the Future como resposta à sua frustração com a falta de oportunidades para as mulheres na indústria da música. “Comecei a fazer mais pesquisa e percebi que isto também acontecia no mundo do cinema e no mundo da tecnologia. Como é que posso transformar a minha raiva numa boa solução?”, contou ao site WWD. Depois disso, a artista viria a atuar na histórica Marcha das Mulheres (Women's March on Washington), onde milhares de pessoas se manifestaram contra Trump com o objetivo de chamar a atenção para os direitos das mulheres, um dia após as eleições. Mas além do seu claro envolvimento político, a cantora pop destaca-se também pelo seu papel enquanto defensora dos direitos LGTBQI+, sobretudo após a decisão de tornar público o facto de ela própria pertencer à comunidade.
Quando estava prestes a lançar o álbum Dirty Computer, em abril de 2018, Monáe assumiu-se como pansexual. “Sendo uma mulher negra e queer na América, uma pessoa que já namorou com homens e mulheres, considero-me uma filha da mãe muito livre”, disse à Rolling Stone. Numa longa entrevista, a artista falou abertamente sobre a sua sexualidade e explicou o caminho que trilhou até se sentir confortável com o conceito, que designa a existência de uma atração sexual ou amorosa entre pessoas independentemente do seu sexo ou identidade de género. “Quando li mais tarde sobre a pansexualidade fiquei do género ‘Oh, estas são coisas com as quais me identifico’”, contou à publicação norte-americana. Apesar de a cantora admitir que a “revelação” não foi propriamente uma revelação (“Se ouvirem os meus álbuns, está tudo lá”), a verdade é que este momento foi mais um marco no estatuto da artista que a consolidou enquanto rosto da comunidade. Janelle fê-lo para inspirar “as miúdas, os miúdos, os não binários, os homossexuais, os heterossexuais e as pessoas queer que estão a ter dificuldades em lidar com a sua sexualidade, que se sentem ostracizadas ou atacadas por simplesmente serem elas mesmas”.
E se, no início da carreira, Monáe se debatia para corresponder a um estereótipo (“Tudo o que vi era que era suposto parecer-me com determinada coisa nesta indústria e senti que não era bem a imagem estereotipada de uma artista feminina negra”, admitiu à Rolling Stone), hoje usa cada oportunidade para passar a sua mensagem. Ainda no mês passado — junho é, por regra, associado ao orgulho LGTBQI+ — a artista protagonizou a capa da revista Paper. Na entrevista, o ativismo surgiu espelhado a cada farpa lançada ao sistema de ensino: “A identidade de género tem de ser ensinada nas escolas. Deviam existir cursos sobre saúde mental, como coexistir, como podemos aprender com os outros”; “Temos de ser ensinados sobre como lidar com os bullies e os bullies precisam de ser ensinados sobre as repercussões de fazer bullying a alguém”.
Num momento em que muito se fala da importância da representatividade e se exaltam as histórias de aceitação, Janelle também nos faz pensar numa questão muitas vezes ignorada. “Temos de garantir que não pressionamos as pessoas a assumir-se”, diz, na mesma entrevista à Paper. “Nem toda a gente tem as mesmas circunstâncias. Há pessoas, jovens em particular, que vão ser abandonados pela família, enforcados ou presos se decidirem dizer a sua verdade. Pessoas que não estão confortáveis em falar sobre a sua sexualidade publicamente, nós vemos-vos e vocês são válidos e vocês importam. Temos de proteger os nossos bebés, particularmente na comunidade LGBTQIA+”, explica. E remata: “Nós temos de fazer melhor”.
Artigo originalmente publicado na edição de julho 2019 da Vogue Portugal.