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Amarelo é vida

05 Aug 2022
By Diego Armés

E a vida é amarela. Pelo menos, à flor da pele de inúmeras personagens que compõem o imaginário infantojuvenil de pessoas de todas as idades. Quem são os bonecos amarelos que nos povoam as fantasias e porque é que são dessa cor?

E a vida é amarela. Pelo menos, à flor da pele de inúmeras personagens que compõem o imaginário infantojuvenil de pessoas de todas as idades. Quem são os bonecos amarelos que nos povoam as fantasias e porque é que são dessa cor? Click here for the English version. Será talvez descabido tentar determinar de que cor é o sopro de vida, aquilo que nos anima e a que chamamos alma. Desde quando é que a alma tem cor? Esta conversa não tem pés nem cabeça — a não ser que a desloquemos habilmente para o território da fantasia. Alma, a palavra, tem origem etimológica no latim anima, que significa sopro ou brisa (e assim se justifica o lugar-comum — um lugar-comum bem bonito, diga-se — “sopro de vida” que se usa no início do texto). Se os deuses, ou um só deus, ou a energia do universo, ou outro impensável agente ao serviço da biologia e de qualquer força indiscernível do cosmos, soprou nos humanos a vida de que temporariamente gozam, os próprios humanos, ostentando ilusões de serem, eles mesmos, divindades, decidiram animar também coisas. Entre essas, e sendo a única que nos interessa agora, encontram-se os desenhos animados, fantasias materializadas que se mexem diante dos nossos olhos e que nos encantam, envolvem, seduzem, fazendo-nos rir e sentir coisas. Fica, assim, legitimada a pergunta: de que cor é o sopro de vida com que animamos um desenho? Não há uma só cor para estes sopros de animação, contudo há uma cor que sobressai de entre as demais: não temos dúvidas acerca da cor do espírito que habita e faz mover, por exemplo, Bart Simpson — é amarelo, e bem vivo. A teoria do amarelo Pessoas especialistas em explicar-nos porque razão o amarelo é usado em bonecos animados na televisão explicam-nos que a escolha do amarelo para dar vida aos desenhos se deve a uma espécie de manipulação sensorial subliminar. Aparentemente, o olho humano é sensível ao amarelo — há quem garanta, entre estes especialistas, que o amarelo é até resistente ao daltonismo, o que mostra bem o poder daquela cor. Quem diz o olho humano, diz o sopro que nos anima: o amarelo é um encanto para a alma, sugerindo-nos, por exemplo, o sol, o aconchego e a alegria; estimula-nos o intelecto e agita-nos a energia (há quem garanta que o amarelo é a cor da energia). “O amarelo gera energia muscular”, lê-se, não sem alguma desconfiança, no site TV Over Mind. “O amarelo é muitas vezes associado a comida”, acrescenta-se ainda no mesmo sítio. Omeletes à parte, a verdade é que — e aqui acreditamos nos especialistas — as personagens amarelas têm muito mais probabilidades de nos suscitarem sentimentos e pensamentos positivos. Dir-se-ia, portanto, que o amarelo é também a cor da graça. Há quem proponha uma explicação mais técnica e, possivelmente, menos entusiasmante. Tem a ver com o espectro de cores e, em particular, com a maneira como esse espectro é apresentado num ecrã de televisão. Segundo especialistas que encontrámos um pouco por toda a Internet, o espectro de cores difere da televisão para o mundo real. Neste último, a cor que faz realçar o amarelo será o púrpura; no mundo da televisão, a cor de contraste que faz com que o amarelo sobressaia é — e a conclusão não é, de todo, surpreendente — o azul. Como o azul é uma cor com abundante presença nos cenários de desenhos animados — no céu, no mar, nas estradas, etc. —, o amarelo fica beneficiado e torna-se altamente notório aos olhos humanos. Assim se explica que tantos bonecos tenham tez amarela: é uma mistura de manipulação subliminar das nossas emoções com a vantagem técnica e cientificamente comprovada de se fazer notar num determinado contexto. É extensa a lista de personagens de animação cuja pele é amarela, ou cujo aspeto é remotamente amarelado: do Tweety ao Winnie the Poo, da Abelha Maia aos Minions, do Mighty Mouse ao Wolverine (o super-herói anteriormente conhecido por Volfrâmio), da Vaca (de Cow and Chicken) ao Pikachu, passando por SpongeBob, Charlie Brown ou Wubbzy, são muitos os seres amarelos que nos seduzem no pequeno ecrã. Porém, um criador em particular levou muito a sério a importância do amarelo e da energia que emana dessa cor na animação: Matt Groening, o criador de Os Simpsons. A série animada sobre a família mais amarela dos Estados Unidos da América, que encanta telespectadores desde o final da década de oitenta, foi a primeira a ser concebida em termos cromáticos a partir das noções de perceção. Groening quis, ao amarelar todos os protagonistas e demais personagens, diferenciar — e, se hoje a tendência que marca as correntes é a das coisas diferenciadas, nesse tempo longínquo ser-se diferenciado era realmente original — a sua criação das outras séries de animação que continham personagens de todas as cores. Aparentemente, ao mudar-se de canal, se passássemos pelos Simpsons ficávamos imediatamente a saber que era Os Simpsons que estava a dar: uma vez mais, o amarelo distintivo com que se pintava a pele de (quase) todas as personagens segurava na memória do telespectador a imagem dos bonecos de Springfield — por oposição à generalidade dos desenhos animados que se pintavam de diversas cores. Personagens e criações Será quase unânime eleger Os Simpsons como a melhor e mais famosa animação amarela da história da televisão, ou pelo menos da televisão do mundo ocidental. As histórias mirabolantes e as peripécias da família Simpson, bem como as dos seus vizinhos e colegas de escola, de trabalho e de balcão do bar do Moe, fizeram e continuam a fazer as delícias de adolescentes (e de muitos adultos) com o seu humor surpreendente, muitas vezes no limiar do absurdo, outras vezes descaradamente para lá dessa linha com que tentamos separar o real do surreal no quotidiano (nem sempre com sucesso). É muito difícil eleger uma só personagem entre este complexo e descomplexado retrato caricatural de uma América com os estereótipos esticados e distorcidos. Para se perceber o alcance dessa caricatura americana, podemos começar pelo lugar onde tudo acontece, Springfield. Existem, nos Estados Unidos da América, 34 cidades com esse nome. Quantos Homers e quantos Barts existirão nessa América indistinta, convencional, repetível? E quantos Ned Flanders, quantos Nelson e quantos Mr. Burns e respetivos Smithers? Nem os psicopatas — Sideshow Bob — escapam a este divertido e mordaz raio-X dos Estados Unidos que vem fazendo as delícias dos seus fãs desde há 35 anos, quando se estreou num formato diferente, no The Tracey Ullman Show, em 1987. Em 1989, a extraordinária criação de Matt Groening ganharia o estatuto de série regular, passando a ser uma sitcom de animação. Hoje, Os Simpsons contam 33 temporadas e são a série de animação mais longa de sempre da televisão estadunidense.Acontece que a vida amarela das animações não é feita só de Simpsons. Então e o SpongeBob? Então e o Pikachu? Então e o Tweety, e os Minions, e o Wolverine? Se tivéssemos de escolher uma criação para ocupar o segundo lugar das melhores animações amarelas da TV, teríamos um grande problema. Não é fácil decidir entre SpongeBob, os Minions e o Pikachu. O que se passa em Bikini Bottom — a fenda oceânica onde vive SpongeBob e toda a sua comunidade — é inspirado na paixão do criador da série, Stephen Hillenburg, pela vida marinha. Hillenburg era biólogo marinho antes de se ter dedicado à animação e concebeu, algum tempo antes do formato final de série televisiva, um livro educativo intitulado The Interdital Zone, no qual era protagonista Bob, a Esponja. É precisamente essa esponja marinha amarela que protagoniza SpongeBob SquarePants. Na série, SpongeBob é uma personagem muito engraçada, desas- trada e infantil. Já os Minions — ou Mínimos, na versão portuguesa (no fim de junho, estreou-se o novo filme com estes seres hilariantes à solta) — são uma deliciosa invenção concebida para encher de graça o filme Despicable Me (Gru – O Maldisposto, em português) e que depois acabou por ganhar vida própria e seguir o seu caminho, com ou sem Gru. É que junto destes minions — descritos como “seres multicelulares amarelos que existem desde o início dos tempos” — é impossível ser-se mal-disposto: são as criaturas mais caóticas, trapalhonas, desastradas, outra vez caóticas, desorganizadas, desmioladas e imparáveis de toda a animação — se isto fosse uma competição, provavelmente o segundo lugar seria deles. Por fim, temos o Pikachu, o mais célebre e desejado e adorado do universo Pokémon. Nascido no Japão em 1996, o Pikachu era inicialmente uma personagem secundária, ainda no tempo em que os Pokémon eram um jogo de computador. Foi na adaptação para série televisiva que os seus criadores perceberam o real potencial do Pikachu e fizeram dele a mascote da produção. Como principais características — além da evidente cor amarela —, o Pikachu tem o facto de ser um rato (só que extremamente fofinho) e de não comunicar por palavras: limita-se a repetir as sílabas do seu nome com diferentes entoações, aumentando assim o seu grau de fofice (há, no entanto, quem discorde e o considere irritante, o que também não é descabido). Claro que a escolha das melhores personagens e criações, nomeadamente as amarelas, será sempre subjetiva. Simba, de O Rei Leão, é uma extraordinária figura de animação, assim como os clássicos Top Cat ou Mighty Mouse, o Linguado de A Pequena Sereia, Jake the Dog ou o próprio Pluto, do universo Disney. Mas os Simpsons são os Simpsons. Num mundo animado ideal e amarelo, teremos sempre Springfield. Texto originalmente publicado no The Sunny Vibes Issue, disponível aqui.

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