Pierpaolo Piccioli arrecadou o prémio de 'Designer of the Year' na mais recente edição dos Fashion Awards britânicos. A Vogue conversou em exclusivo com o criador italiano sobre a sua visão e imaginação enquanto criativo na Valentino.
Diversidade é uma constante presente nas mais recentes coleções da Valentino. Como diretor criativo, Pierpaolo Piccioli arrecadou o prémio de Designer of the Year na mais recente edição dos Fashion Awards britânicos. A Vogue conversou em exclusivo com o criador italiano sobre a sua visão e imaginação.
Na gala anual dos Fashion Awards, organizada pelo British Fashion Council, que decorreu na noite de 10 de dezembro, no Royal Albert Hall, o diretor criativo da Valentino, Pierpaolo Piccioli foi galardoado como Designer do Ano (prémio que, no ano de 2017, foi entregue a Raf Simons da Calvin Klein). Dias antes de conversar connosco, Piccioli soube da novidade, mas continua sem acreditar. “Tens mesmo a certeza de que sou o vencedor, não estou só nomeado?”, interroga-nos. Para aqueles que têm acompanhado a sua evolução enquanto designer, primeiro como co-criador ao lado de Maria Grazia Chiuri, entre 2008 e 2016, ano em que Chiuri deixou a Casa italiana para transitar para a Dior, esta notícia não é de todo uma surpresa.
Valentino Alta-Costura, primavera/verão 2018 © Getty Images
Valentino Alta-Costura, primavera/verão 2018 © Getty Images
Quando nos apresentou a coleção de Alta-Costura para a última primavera/verão, Piccioli mostrou-nos uma coisa que não sabíamos que precisávamos: uma beleza pura e fantástica. Em retrospectiva, este é outro exemplo de como a Moda atua como um barômetro para um mood coletivo. Analisar os eventos noticiosos do ano passado e a direção pela qual Pierpaolo nos está a levar, não é com surpresa que concluímos que o designer nos oferece uma fuga momentânea, mas ao mesmo tempo a certeza de tudo pode acontecer e a imaginação e criatividade podem ainda florescer.
No desfile, a criatividade de que falamos foi vista numa coleção repleta de folhos, estampados floridos e explosões dramáticas que deram lugar a coordenados monocromáticos. Na cabeça, as modelos usaram peças de Philip Treacy, alguns com penas coloridas de Crayola e outros com flores exuberantes. Um “fluxo de consciência,” foi assim que Piccioli descreveu aquela coleção, comparando ainda os moodboards e os tecidos ao monólogo de Molly Bloom em Ulysses, de James Joyce. Quem teve oportunidade de ver esta coleção em primeira mão, não só se divertiu com os visuais mas, ao mesmo tempo adquiriu conhecimento in loco do processo criativo do designer.
Pierpaolo Piccioli acredita que o seu trabalho como criador é sobre a sua visão da Beleza, não do mundo. “Todos temos maneiras diferentes de reagir ao mundo em que estamos a viver. Para mim, é voltar às minhas raízes da Alta-Costura,” conta-nos. Crescer em Nettuno, uma pequena cidade costeira a 70 quilómetros do sul de Roma, significa que a porta de entrada para a indústria da Moda era no mundo das revistas e, nos dias de hoje, está cada vez mais voltado para esse tempo, onde se debruçava sobre as imagens dos vestidos de Charles James, fotografados por Richard Avedon e Deborah Turbeville.
Valentino, primavera/verão 2019 © ImaxTree
Valentino, primavera/verão 2019 © ImaxTree
Chegou à Valentino em 1999 e o encontro que teve com a Alta-Costura não era nada como imaginava. “Eu tive uma ideia que se baseava na leveza e no movimento, mas os vestidos que vi através das fotografias pediam muitas camadas de tule para ficaram muito grandes,” começa por nos contar. “O esforço que foi feito para construir estas roupas era visível. Nos meus projetos, o que pretendo fazer é subtrair todo o peso e fazer Alta-Costura tal como a via com os meus olhos quando era criança. Quero manter-me fiel à minha imaginação.” Até mesmo a quantidade de coordenados pretos que apresentou na passerelle de pronto-a-vestir para a primavera/verão 2019 - todos em renda, pele e lã-crepe - mantiveram um ar efervescente, com a profundidade de uma pintura de Piero della Francesca.
A abordagem da Valentino em relação à proporção, textura e cor tornou-se cada vez mais experimental desde o dia em que Piccioli assumiu controlo exclusivo do seu papel enquanto criativo. “Quando trabalhas com outra pessoa, as tuas emoções materializam-se em pensamentos, tudo é mais racional porque tens que falar, tens que partilhar uma visão,” confessa o designer sobre os anos em que trabalhou com Maria Grazia Chiuri. “Quando trabalhas sozinho, tudo muda. Ficas mais consciente de ti mesmo. Hoje, não preciso de perceber o porquê de gostar de alguma coisa, é intuição.” Contudo, o designer admite que precisa de manter uma balanço constante entre a sua própria identidade e aquilo que a marca pede, se um substitui o outro o resultado final não dá certo.
Valentino, Pre-fall 2019 © Getty Images
Valentino, Pre-fall 2019 © Getty Images
Esta abordagem mais flexível, ganhou contornos mais profundos no mês passado quando o criador italiano apresentou a Pre-fall 2019 em Tóquio, onde conjugou as suas ideias com a filosofia japonesa wabi-sabi - que aceita a imperfeição, uma visão que Pierpaolo concorda ser menos rígida e completamente mais contemporânea que a cultura ocidental. Dentro desta coleção, perfeitamente imperfeita, houve espaço para um capítulo de coordenados dedicados à cor da etiqueta, o vermelho que “às vezes parece super-poderosa e forte” e Piccioli quis torná-la “mais romântica, mais frágil e poética.”
Não é só na cor que Pierpaolo está a pensar, ele também esta a suavizar a Moda e torná-la mais acessível. “Nos dias de hoje, não podemos pensar em pessoas com castelos e no estilo de vida do jet set. Não precisas de comprar Alta-Costura para usufruir da Alta-Costura. Quero incorporar mais cultura, mais pessoas e mais diversidade na Valentino.” Foi por isso mesmo que vestiu Frances McDormand, quando em março a atriz norte-americana recebeu o Óscar de Melhor Atriz, mais tarde em maio, voltou a surpreender ao aparecer na red carpet da Met Gala com uma capa e um adorno na cabeça, idealizados por Pierpaolo Piccioli. A individualidade refrescante que o designer nos apresente estação após estação é aquilo que quer que as pessoas descubram nas suas roupas. “Eu gosto de ver esse tipo de harmonia nas pessoas, quando eles se sentem confiantes em si mesmas.”
Pierpaolo Piccioli é o novo favorito da red carpet e ao mesmo tempo um novo imperador da Alta-Costura, contudo a pergunta que paira no ar é: estarão os seus pés estão bem assentes no chão? A resposta está na pequena cidade à beira-mar, onde o seu Fashion Award residirá. “É um lugar de onde eu queria fugir quando era criança,” começa por nos contar. “Recentemente, voltei lá com a minha mulher para ver os nossos filhos a crescerem e lá as pessoas não me olham como um designer, mas sim como o mesmo rapaz que lá vivia há uns anos.”