Ou a joia da coroa – de flores, claro. Falamos da rosa e das mil rosas que fazem as delícias de perfumistas e amantes de perfume. E a prova que o rosa já não é só para as meninas é que as fragrâncias masculinas e unissexo apostam cada vez mais nesta matéria-prima.
Ou a joia da coroa – de flores, claro. Falamos da rosa e das mil rosas que fazem as delícias de perfumistas e amantes de perfume. E a prova que o rosa já não é só para as meninas é que as fragrâncias masculinas e unissexo apostam cada vez mais nesta matéria-prima.
© Jonatan Fernstrom / getty images
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Ao longo da história da perfumaria, a rosa vai aparecendo como peça central ou como alavanca para outras notas. Quase sempre aparece associada à beleza, à feminilidade, à sedução, não fosse o mito grego dizer que a flor nasceu das lágrimas de Afrodite, deusa do amor, quando chorava por Adónis. Mas só no século XX é que o reforço e imposição de demarcados papéis de género impuseram a flor como o coração das fragrâncias femininas. Até então, a rosa era usada em toda a perfumaria e até existem registos de receitas francesas do século XVIII que explicavam como fazer água perfumada para homem em que um dos ingredientes listados eram rosas em abundância.
“Apesar da fragrância não ter género, há tipos de perfumes que são mais usados por mulheres do que por homens, e vice-versa. As rosas são, na cultura Ocidental, mais associadas a fragrâncias femininas, mas a verdade é que também são formuladas em fragrâncias masculinas, há séculos. Aliás, no Médio Oriente, a rosa, normalmente emparelhada com Oud (pau-de-águila) é muito popular entre os homens. Atualmente estamos a assistir a um crescimento do uso de rosas em fragrâncias masculinas mainstream. E as rosas podem ter um cheiro incrivelmente sexy na pele de um homem”, conta Lorna Mckay, cofundadora da plataforma The Perfume Society e autora do livro The Perfume Bible. A popularidade da rosa no mundo da perfumaria também se prende com a variedade de espécies. Tanto quanto se sabe, existem mais de três mil tipos de rosas, cada uma com as suas particularidades e características únicas. No entanto, o monopólio de produção de rosas é detido por poucos países, explica Lorna: “As rosas mais comummente usadas na perfumaria são a rosa turca, a rosa damascena e a rosa centifólia – cultivada em Grasse, no Sul da França, é conhecida como rosa mil-folhas e é considerada aquela que produz o concentrado de mais elevada qualidade. Esta rosa também é conhecida como rose de mai, por florescer no início do verão, e como the painter's rose por ser a estrela de várias obras artísticas. Cerca de 70% do óleo de rosa comercializado em todo o mundo vem da Bulgária e outros grandes produtores são a Turquia, o Irão, Marrocos e, em quantidades menores, mas mais preciosas, Grasse.”
No mundo dos perfumes mainstream, produzidos em massa e com lugar marcado em quase todas as prateleiras, a rosa aparece aqui e acolá, mas nem sempre é fácil encontrá-la como ingrediente estrela. Isto deve-se, em parte, ao preço da matéria-prima, que advém do quão difícil é prepará-la. A este fator acresce ainda a fragilidade da flor e o seu curto tempo de duração, a partir do momento em que é colhida. “A rosa é uma matéria muito dispendiosa na perfumaria porque tem de ser colhida à mão antes das dez horas da manhã, já que depois desta hora o sol começa a evaporar a sua essência mágica. A rosa também se degrada muito rapidamente. Aliás, os agricultores na Turquia e na Bulgária levam as panelas de cobre para os campos para as aquecer e destilar logo após a colheita para obterem assim o óleo essencial. Mas até esta conversão para óleo acontece em quantidades muito pequenas: cerca de 170 rosas correspondem apenas a umas gotinhas de óleo, o que faz com que o tenham batizado como ouro líquido. São precisos cerca de 3500 quilos de rosa para obter um quilo de óleo de rosa”, descreve a especialista.
Mas não é por isso que o ingrediente deixa de fazer brilhar os olhos de qualquer criativo da perfumaria. O encanto da flor está na multiplicidade de espécies à disposição, claro, mas também na singularidade camaleónica que a caracteriza. A rosa pode ser o que quem a trabalhar quiser. “A rosa é um dos aromas mais complexos da perfumaria”, começa por descrever Mckay. “Tanto pode ser frutado e ter notas de framboesa como pode ser profundo e aveludado. Os perfumistas dizem que é uma das matérias-primas mais complicadas de dominar precisamente pela sua complexidade. Para recriar ou preservar a sua excelência e o aroma fresco de rosa acabada de colher é preciso muito trabalho e mestria. O cheiro a rosa depende daquilo com que o casem. Pode ser doce, almiscarado, frutado, picante ou fresco, pode ser subtil ou pungente, pode ser masculino ou feminino.”
Podemos então dizer que a rosa é uma das bases da perfumaria? Tecnicamente, não, como Lorna acabará por explicar. Mas, objetivamente, sim, sendo que é um ingrediente muito usado e a sua versatilidade faz com que esteja presente em fragrâncias de várias famílias, sendo elas femininas ou masculinas. Apesar de nem sempre aparecer em destaque na descrição das notas de um perfume, a rosa pode estar presente para potenciar uma outra nota e daí ganha o seu traço de mistério, quando aparece escondida por outra nota, como uma agente secreta da formulação. “Há notas de rosa em imensas fragrâncias, mesmo naquelas que não são descritas como florais ou como fragrâncias de rosa. A rosa tem a capacidade de adicionar inúmeras facetas diferentes a uma fragrância, e isso também depende do tipo de rosa e de como o perfumista escolhe usá-la na composição. Estima-se que pelo menos 75% das fragrâncias femininas modernas tenham rosa na sua composição, assim com 10% das fragrâncias masculinas – mas podem nem aparecer listadas nas suas descrições. Tecnicamente é errado dizer que a rosa é a base de uma fragrância, uma vez que, tal como as restantes flores, são quase sempre formuladas no meio da fragrância [sendo notas de meio/ de coração]. As rosas trazem um aroma misterioso e mágico às várias facetas de um perfume”, conta à Vogue.
E, na longa história da perfumaria, que fragrâncias icónicas que celebram o aroma a rosa devemos recordar? A pergunta é complicada e é quase ingrato para a flor reduzi-la a uma lista sucinta, já que não falamos de uma novidade nem de uma moda passageira. A rosa tem lugar cativo e bem central na perfumaria, mas há, claro, destaques, momentos, que ficam para sempre. “O Trésor, da Lancôme (lançado em 1990) é um ícone das fragrâncias de rosa, usada de uma forma muito romântica pela perfumista Sophia Grojsman e personificando o suave cair das pétalas com um toque de pele de pêssego. Eu lancei este perfume nos anos 90 quanto era compradora de Perfumaria e Cosmética para a loja Harrods e ainda tenho alguns frascos desse ano. Era uma fragrância poderosa e brilhante, criada para mulheres que gostam de notas orientais e de almíscar – e a embalagem era uma obra de arte. Paris, da Yves Saint Laurent (1983) é outro exemplo maravilhoso de um clássico moderno – e é outra criação de Sophia Grojsman –, é o pináculo dos florais dos anos 80, hoje maravilhosamente atualizado para o Mon Paris. Este perfume explorava um lado mais sensual da rosa”, relembra a especialista. Mas descanse, não se esgotaram as formas de inovar e de fazer brilhar a rosa. Há fragrâncias recentes que honram e reinventam essa nota floral. “Mais recentemente, um exemplo de um twist moderno é o Neon Rose, da Floral Street: uma fragrância fresca, limpa, verde e floral”, conclui Lorna Mckay. Long live the rose.
Este artigo originalmente publicado na edição de maio de 2021 da Vogue Portugal.
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