Cria coleções com o material que fez com que se apaixonasse pela área e já se tornou a sua imagem de marca: a malha. Futurista, Susana Bettencourt é a tricotadeira do amanhã.
Cria coleções com o material que fez com que se apaixonasse pela área e já se tornou a sua imagem de marca: a malha. Futurista, Susana Bettencourt é a tricotadeira do amanhã.
De raízes açorianas, mais precisamente de São Miguel, Susana Bettencourt viveu mais de dez anos em Londres, onde se licenciou em Design de Moda com especialização em Malhas, na Central Saint Martins College of Art and Design, e concluiu com distinção o mestrado em Moda Digital, na London College of Fashion. Foi em terras de Sua Majestade que a sua verdadeira identidade criativa foi formada, propondo-se a combinar as ideias de design contemporâneo com a indústria de tricô portuguesa e as suas técnicas artesanais tradicionais - assumindo assim o handmade knit technology como o seu ethos. Ensinada pelas suas tias, avó e bisavó, que eram malheiras de paixão, Susana pratica as suas artes desde muito jovem. “A minha recordação de infância mais antiga é ter aprendido a fazer croché aos cinco anos, com a minha avó, na ilha de São Miguel. Nessa altura, a minha madrinha também me ensinou a fazer malhas e, aos poucos, lá fui criando peças de roupa para as bonecas que comprava. A partir daí nasceu o gosto pela moda e o prazer de trabalhar com malhas, que, para além das rendas, são os materiais que predominam nas minhas coleções”, disse Susana em entrevista à revista UP corria o ano de 2012.
Susana Bettencourt Outono/Inverno 2020
Susana Bettencourt Outono/Inverno 2020
Todas as peças são o resultado de uma fusão entre trabalho artesanal e trabalho digital. A marca procura opor-se à massificação atual, exigindo um futuro mais sustentável, atendendo às necessidades do planeta. Além disso, visa estimular a desaceleração, propondo um consumo mais consciente, com apenas uma coleção comercial por ano. As suas coleções de malhas foram apresentadas e distinguidas em várias cidades do mundo, passando por Londres, Vancouver, Viena, Moçambique e Roma e os designs usados por diversas personalidades como Lady Gaga, Susanna Lau e Ana Moura. Durante o desfile no Victoria and Albert Museum, as peças de Susana Bettencourt chamaram a atenção de um dos consultores de imagem de Lady Gaga e a designer desenhou-lhe peças exclusivas, que incluem uma coroa de cabeça e um colar gigante todo feito em cobre. Aliás, foi à diva da pop que Susana vendeu a sua primeira peça, há quase uma década.
Susana Bettencourt AW19
Susana Bettencourt AW19
A vontade de criar e de fazer sucesso no mundo da Moda sobrepôs-se a qualquer incerteza: “quando era adolescente e pensava na área que queria escolher, tive as minhas dúvidas, a minha curiosidade sobre os comportamentos e mente humana quase me levaram à psicologia, mas foram indecisões que não passaram do 10º ano. Desde então, por mais que custe, seja com a minha marca como veículo, seja pelo ensino ou mantendo o meu atelier um espaço de partilha de conhecimento e colaboração, (...) foi para as malhas que nasci,” partilha Susana através de uma troca de e-mails com a Vogue.
A coleção Primavera/Verão 2020, Super Humano - Hora de mudar, nas lojas atualmente, é uma homenagem a todos os seres humanos que vivem nesta era, onde o relógio não pára e as horas do dia não são suficientes. Quase toda a população sofre de síndrome de pensamento acelerado, fazendo malabarismos para gerir várias tarefas numa só. A simbologia do tempo e dos relógios foram escolhidos por Susana para representar um novo ser humano em mutação, em adaptação. Cada fio que entra na máquina, 100% oriundo de desperdício têxtil ou do próprio atelier da designer, torna-se parte da peça final.
Já para o Outono/Inverno 2020 Susana Bettencourt decidiu explorar o conceito de individualidade e todos os fragmentos que compõem o ser humano. “As memórias, os dissabores, as vitórias e até os nossos demónios tornam-se naquilo que somos”, é o ponto de partida para a coleção Overload. A designer mostra-nos através do knitwear como todos os pedaços se juntam e dão origem a uma estrutura da qual fazem parte universos completamente opostos. Todas as coleções utilizam recursos disponíveis e esta é cada vez mais uma característica da marca, que pretende combater a produção massiva e tóxica do fast fashion ao mesmo tempo que apoia iniciativas de cariz social - como foi o caso da coleção Saving Lives Changing Lives cujo objetivo foi chamar a atenção para os alarmantes números de suicídios em Portugal e apoiar a Associação do Telefone da Amizade (ATA), fundação que auxilia vítimas da depressão e ansiedade.
Susana gostaria que lhe fizessem mais perguntas sobre o processo, tanto criativo como produtivo, até à peça final - que acredita ser desconhecido para a maioria das pessoas. Detesta que lhe perguntem sobre tendências. Não segue tendências nem pensa nelas no contexto da sua marca. “A minha marca tem uma identidade, tem um fio conceptual condutor entre as coleções que adoro seguir e evoluir. Para além disso, tem um público alvo com uma voz muito ativa, é isso que eu sigo”, explica a designer açoriana à Vogue, adiantado que acredita na união na indústria, mas talvez não como as pessoas imaginam. E vai mais longe, dizendo que se fizesse uma colaboração com um colega designer português seria com Marques’Almeida pelo ADN de desconstrução das peças ou com David Catalán, que já aposta nas malhas no seu universo criativo. “Para haver união entre todos, precisamos de um líder que todos respeitem e neste momento temos várias lideranças. Ou precisamos que seja realmente uma parceria vantajosa para todos”, observa Susana. Acrescentando que “Se a moda portuguesa for vista como o produto de valor acrescentado e único que nós podemos criar, todos ganhamos. Acho que a nossa comunidade a nível de história, criação e produção têxtil e Moda, já faz o produto que queremos vender, mas temos de melhorar no processo de venda propriamente dito. Achamo-nos sempre menos que os outros e por isso vendemos por pouco. Mas também me questiono, que indústria é realmente unida? Essa união romântica é necessária para o seu funcionamento ou podemos apenas planear um contrato e negócio bom para todos?” E quem fala assim não é Gaga, isto é, gago.
Susana Bettencourt está à venda online, na loja-atelier em Guimarães, nas lojas Scar-ID, Vivent-ID e Panamar, no Porto, e na 39A Concept Store, em Lisboa.
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