THAKOON, uma proposta que junta, debaixo do mesmo teto, um zine, um site interativo e uma linha de básicos que respiram modernidade. Respect.
Em meados de 2017, no auge de uma carreira muito bem-sucedida, Thakoon Panichgul decidiu encerrar a sua marca homónima e virar costas à Moda. O designer, um dos preferidos da indústria, não receou o esquecimento nem o fim de um certo hype que começara com o lançamento da sua primeira coleção, em 2004. Agora regressa com THAKOON, uma proposta que junta, debaixo do mesmo teto, um zine, um site interativo e uma linha de básicos que respiram modernidade. Respect.
Mesmo quem nunca viu O Leopardo (1963), obra maior do realizador Luchino Visconti, já se deparou aqui e ali com uma das suas frases mais conhecidas: “Para que tudo fique na mesma, é preciso que alguma coisa mude.” Porém, a sentença proferida por Tancredi Fal-coneri, interpretado soberbamente por Alain Delon, é ainda mais cínica. “Para que tudo fique na mesma, é preciso que tudo mude.” Foi assim que o escritor Giuseppe Tomasi de Lampedusa quis contar a decadência da aristocracia italiana durante um dos períodos mais conturbados do século XIX. E foi assim, também, que Thakoon Panichgul (Tailândia, 1974) decidiu escrever o seu destino – alterando completamente o rumo da sua vida, que a olho nu parecia um conto de fadas.
Façamos rewind. Panichgul tinha 11 anos quando chegou aos Estados Unidos, com a família. Frequentou a Bellevue West High School, no Nebraska, e em 1997 graduou-se pela Universidade de Boston, com uma licenciatura em economia. Depois, mudou-se para Nova Iorque onde ingressou na prestigiada Parsons School of Design. Entre 2001 e 2003, aprendeu tudo o que podia sobre Moda. A sua primeira coleção de pronto-a-vestir, apresentada em 2004, foi aclamada pela crítica e pelo público. Tornou-se um dos protegidos de Anna Wintour, diretora da edição americana da Vogue. Três anos depois, lançou uma edição limitada com a marca The Gap (em 2009 viria a fazer o mesmo com a cadeia Target). As suas roupas eram usadas em red carpets de Hollywood a Washington. Demi Moore, Sarah Jessica Parker, Rachel Bilson e... Michele Obama – era seu o vestido que a primeira dama envergava na noite em que o marido aceitava a nomeação democrata para presidente.
Descrevê-lo como um “caso de sucesso” seria demasiado simplista. Thakoon tinha o mundo a seus pés. E, no entanto, estava cansado. Sentia-se asfixiado pela velocidade a que a Moda – sua grande paixão, tinha sucumbido. De um momento para o outro, afastou-se. Saiu de cena. Aproveitou para “exercitar a mente e o corpo.” Descobriu novas formas de comunicar, de fazer, e de pensar, roupa. Ao longo de 2019, quando sentiu que estava pronto, foi levantando o véu da nova THAKOON. Um zine para mulheres que são apaixonadas pelo guarda-roupa dos homens (apropriadamente chamado HommeGirls), um site a condizer, uma coleção de básicos cool a preços millennial e uma nova loja em Bleecker Street, no coração da sua Nova Iorque. Tudo mudou e, de certa forma, tudo ficou na mesma, porque o homem por detrás deste masterplan é o mesmo. Mas sente-se um sopro de originalidade e rebeldia no ar. É preciso coragem.
Porque é que decidiu fechar a sua marca, em março de 2017? Queríamos repensar o nosso foco e a nossa estratégia. Inicialmente, abordámos a ideia de vender direct-to-consumer logo em 2016, com um preço de designer, e aprendemos rapidamente que é mais difícil para o consumidor direto. Por isso, precisámos de mudar de rumo e abordar a coleção a partir de uma estratégia de preço diferente, ou seja, precisámos de fazer uma pausa.
Referiu-se a este tempo como o seu “período sabático.” O que é que fez nestes dois anos e meio? Viajei muito, para Havana, Cidade do México, Bali, Tailândia, Marraquexe, uma série de sítios que sempre quis conhecer. Exercitei muito a mente e o corpo. Queria limpar a mente e começar a absorver novamente o que é importante para o trabalho criativo.
Estava acostumado a criar cerca de 200 looks por ano. Sentiu a falta da correria da indústria? Sabes, é como quando tiras férias, nos primeiros dois, três dias, ainda estás em modo trabalho e acabas por não relaxar realmente até metade das férias. Foi assim no meu período sabático: nos primeiros dois meses, continuava a encontrar-me e a almoçar com amigos da área, a ocupar-me e a manter-me atualizado, porque sentia que, se não o fizesse, não me sentia completo. Mas todo esse sentimento acaba por desaparecer, e percebes que não precisas de estar vinculado a isso e, se relaxares, a tua mente abre-se para muitas possibilidades. Parece clichê, mas quando passas por isto, vês como de facto é verdade.
Porque é que decidiu voltar? Porquê agora? Porque tenho mais a dizer, e a fazer, na Moda. Amo realmente a indústria da Moda, mas vejo que estamos num período de mudança. Por isso quero aproveitar este tempo para abordar as mudanças que vejo no comportamento do consumidor em termos de Moda.
"ACHO QUE UMA MARCA PRECISA DE SER MULTIFACETADA. AS PESSOAS ESTÃO A DESCOBRIR E A LER E A RECEBER INFORMAÇÕES DE DIFERENTES FONTES, POR ISSO DEVEMOS PENSAR NA FORMA COMO ESTAMOS A CONSUMIR MEDIA E MODA." THAKOON
Em junho de 2019 lançou a HommeGirls, que se apresenta como um zine, um site e uma conta do Instagram. Acha que essa é a melhor maneira de abordar o público, hoje em dia, com uma plataforma multimédia? Acho que uma marca precisa de ser multifacetada. Os meios de comunicação expandiram-se e, agora, as pessoas estão a descobrir e a ler e a receber informações de diferentes fontes. O comportamento é diferente, por isso devemos pensar na forma como estamos a consumir media e Moda. Ao mesmo tempo, a narrativa [que queremos contar] deve ser mais precisa, mais focada. A HommeGirls é sobre Moda, mas mais importante que isso é ser sobre um tipo específico de estilo que ressoa em muitas mulheres, particularmente raparigas jovens, nesta nova era onde as mulheres têm mais liberdade, independência e autoexpressão do que nunca... No fundo, trata-se de criar uma plataforma na qual as mulheres se podem unir e sentir empoderadas. É importante oferecer uma voz diferente.
A HommeGirls refere Katherine Hepburn como ícone supremo. Tem portefólios de mulheres reconhecidamente cool, como Cass Bird ou Vanina Sorrenti. É o Thakoon que edita todo o conteúdo? Sim, supervisiono a criação e a edição de todo o conteúdo. É um projeto pequeno pelo qual sou apaixonado e, principalmente nesta fase inicial, quero cuidar dele.
Retrato de Thakoon Panichgul.
Retrato de Thakoon Panichgul.
Como é que a indústria recebeu este projeto? De forma extremamente positiva. Tenho amigos no setor que disseram que não há nada que lhes chame a atenção desta forma há muito tempo, o que é emocionante para mim. Por outro lado, também é interessante que as jovens que nem sequer acompanham Moda estejam enviando direct messages ou emails a dizer que também são inspiradas por HommeGirls, e isso é fantástico – o alcance desta revista/plataforma é e pode ser enorme porque as mulheres podem realmente relacionar-se com isto de forma inata. Elas sentem que não precisam de se conformar com o que a sociedade lhes diz para vestir para serem mulheres.
Em outubro de 2019 lançou a nova THAKOON, uma marca focada em peças básicas, a preços acessíveis. A praticidade e a funcionalidade são a melhor maneira de retomar a sua estética? Penso que, agora, mais do que nunca, a funcionalidade e a praticidade devem ser tão importantes quanto o design ou a estética. Vivemos num mundo onde as pessoas podem usar T-shirt, sweatshirt e ténis no local de trabalho, quer se goste [disso] ou não. A Moda ajudou a introduzir este movimento num espectro mais mainstream. Quando colocas as pessoas [numa zona] de conforto e praticidade, elas não querem abdicar disso. Portanto, devemos ter isso em consideração em qualquer coisa que façamos.
A THAKOON é uma marca direct-to-consumer. Por que é que a criou desta maneira? Porque queremos comunicar diretamente com o cliente. Muitos dos nossos esforços de marketing são diretos, faz sentido que as compras também o sejam.
Capa da segunda edição da HommeGirls, com a supermodelo Christy Turlington.
Capa da segunda edição da HommeGirls, com a supermodelo Christy Turlington.
Há uma frase no seu website que diz “Thakoon Panichgul passou dois anos a pensar sobre o estado da Moda.” A que conclusões chegou? Não há uma definição [específica] para Moda, mas em relação à forma como as pessoas estão a consumir Moda, agora, diria que estamos a vê-la numa plataforma principalmente digital... e no Instagram. A passerelle deixou de ser uma ferramenta focada na indústria para apresentar e vender roupa para lojas especializadas, e passou a ser uma forma de entretenimento. Mas o entretenimento é diferente da roupa que compras e vestes todos os dias, que mudou consideravelmente desde 2004, e é novamente mais prática, agora o [estilo] casual de todos os dias reina. É por isso que precisamos de responder às necessidades das roupas versus o fator de entretenimento que a high fashion oferece.
O que é que o excita, atualmente, em termos de Moda? Estou empolgado com a forma como a Moda permeou na vida de toda a gente... Na escola sempre amei sociologia e olhar a Moda de uma perspetiva sociológica é fascinante. É também um momento emocionante para pensar no branding de uma forma completamente nova, agora que todos podemos fazer isso através do Instagram.
Ainda se imagina a criar aqueles vestidos que fizeram as delícias de Michele Obama e de tantas outras celebridades? Sim, claro. Gosto de pensar nos projetos à medida que vão chegando, não gosto de me limitar.
Por último: com todas estas mudanças, ainda se considera designer de Moda? Sim, mas também diria que sou uma pessoa criativa. Penso criativamente o tempo todo, e muitas vezes sobre Moda... adoro isto.
Artigo originalmente publicado na edição de janeiro 2020 da Vogue Portugal.
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