© Acielle/ Style Du Monde
Depois de trabalhar em Moda durante quase duas décadas - incluindo a maior parte da minha carreira na Vogue - sempre acreditei firmemente no poder transformador das roupas. Mas, nos últimos anos, tenho-me tornado cada vez mais consciente do enorme impacto da indústria da Moda no planeta e envergonhada com a quantidade de compras que costumava fazer.
Foi por isso que decidi passar um ano sem comprar roupa ou acessórios novos, optando por reparar ou alterar o que já tinha. Será que aquele macacão Stella McCartney com um buraco de traça poderia ser remendado, ou as botas pretas Jimmy Choo até ao joelho com o forro rasgado, guardadas no fundo do meu armário, poderiam voltar a ser usadas? Será que um dos fatos do meu falecido pai poderia estar à minha medida, ou mesmo personalizado com o meu monograma? Já muitas vezes mandei alterar roupas para que me servissem - seguindo o conselho da stylist Elizabeth Saltzman, quando ela era diretora de Moda na Vanity Fair - mas esta nova abordagem exigiria outro nível de dedicação.
A reparação é fundamental no que toca ao luxo. Embora as peças de alta qualidade sejam frequentemente concebidas para durar uma vida inteira, mesmo as melhores peças artesanais precisam de ser cuidadas e reparadas com o passar dos anos. Tradicionalmente, as marcas de luxo, desde a Hermès e a Chanel até à Burberry e à Mulberry, oferecem serviços de assistência pós-venda como parte de uma relação a longo prazo com os seus clientes. Mais recentemente, a Net-a-Porter associou-se à plataforma de reparações The Seam, enquanto que a Selfridges estabeleceu uma parceria com a Sojo para oferecer alterações e reparações porta-a-porta.
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O fato da Richard James, do meu falecido pai, que mandei alterar para que me servisse.
Cortesia de Emily Zak
Para além do mundo do luxo, marcas de vestuário de desempenho como a Patagonia e a The North Face têm serviços de reparação internos, enquanto a marca de sapatilhas Veja até se oferece para reparar sapatos de outras marcas em muitas das suas lojas, incluindo em Londres. Para além de ser a atitude mais certa do ponto de vista da sustentabilidade, a co-fundadora da Save Your Wardrobe, Hasna Kourda - cuja plataforma de assistência pós-venda liga uma rede global de fornecedores de serviços de reparação aprovados para marcas como a Loro Piana e a Maje - salienta que quando “os clientes sentem que podem reparar os seus artigos através da marca, isso reforça a lealdade e a confiança”.
No início do meu desafio autoimposto, o objetivo de reparar e restaurar o meu guarda-roupa parecia um território desconhecido. Nem sequer estava confiante na minha capacidade de coser um botão ou fazer uma bainha - desde então, aprendi a fazer as duas coisas, mas, de um modo geral, essa competência outrora comum não foi transmitida. Para muitos de nós, parece mais fácil comprar roupa nova.
Uma primeira auditoria ao meu guarda-roupa revelou um número surpreendente de peças de que me tinha esquecido, que já não me serviam ou que tinha deixado para compôr. No total, eram mais de 20 peças, incluindo quatro pares de calças com as bainhas rasgadas (custo total da reparação e limpeza: 70 euros) e um vestido Joseph bege com dois botões soltos (24 euros para arranjar, incluindo a limpeza). Além disso, havia inúmeros buracos minúsculos, comidos por traças, que precisavam de ser remendados invisivelmente pelo meu alfaiate (12 euros por peça).
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As sabrinas Chanel antes.
Cortesia de Emily Zak
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As mesmas sabrinas depois de terem sido limpas e tingidas de novo.
Cortesia de Emily Zak
Também enviei quatro pares de sapatos para o serviço especializado Classic Shoe Repair, com 60 anos de existência, incluindo um par de sabrinas Chanel que foram limpas e tingidas de novo (92 euros), botas de camurça Chanel que precisavam de uma limpeza e de uma nova biqueira de cetim (144 euros) e botins Aeyde que precisavam de saltos novos (36 euros). Depois, havia as minhas muito queridas botas Jimmy Choo. O custo da reparação do forro interior (organizado através do serviço de assistência pós-venda da marca) foi de 288 euros - caro devido à natureza do dano e à necessidade de as descosturar, mas com um preço de retalho de 1500 euros, 10 anos de uso intenso e, espero, mais para vir, pareceu-me justo. Eu sabia que iria usá-los novamente, e o custo de comprar um novo par semelhante estava mais perto de dois mil euros. Não penso duas vezes antes de pagar a limpeza a seco, por isso decidi pensar nestes custos de reparação como uma espécie de MOT (Mantaine, Organize, Tidy - manter, organizar e arrumar) de Moda.
Quando se tratou de alterações, redescobri a minha gabardina de tweed Stella McCartney, que tinha comprado há oito anos, mas que era demasiado comprida para mim (70 euros para alterar). Outro foco foram vários fatos Richard James do meu falecido pai, que eu nunca tinha planeado usar. Ficavam praticamente intocados no meu guarda-roupa, como recordações nostálgicas dele; de vez em quando, colocava um dos blazers sobre os ombros, pois fazia-me sentir próxima dele. Como parte deste desafio, decidi alterar as calças, que eram vários tamanhos grandes demais, para usar o conjunto como um fato. O meu alfaiate habitual na lavandaria local (dica: costumam ser muito bons) alterou as calças por 70 euros, muito menos do que o custo de um fato novo da Richard James. E embora use frequentemente o blazer sozinho, quando uso o fato completo, parece uma memória vivida.
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As botas Jimmy Choo antes.
Cortesia de Emily Zak
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As mesmas botas depois de serem reparadas.
Cortesia de Emily Zak
De muitas formas, descobrir como prolongar a vida de uma peça pré-existente no nosso guarda-roupa requer mais imaginação do que comprar algo novo. A colega da indústria Tiffanie Darke, que se comprometeu a comprar apenas cinco peças de roupa novas por ano, também encontrou alegria na reparação de peças antigas do seu guarda-roupa. “Ser mais intencional em relação ao que compramos e à forma como cuidamos das nossas roupas pode ser incrivelmente criativo”, diz-me ela ao telefone, recordando como enviou um par de calças de ganga rasgadas para reparação através do Save Your Wardrobe, utilizando a técnica de bordado japonesa sashiko.
Com toda a honestidade, pensei que seria muito mais difícil passar um ano sem comprar nada novo. Mas, de facto, simplificou tudo e reduziu o ruído. Será que preciso mesmo disto? A resposta, pelo menos para já, foi um não definitivo. Em vez disso, a decisão de reparar peças que não usava há anos, ou alterar o que não me servia, resultou em roupas que me pareceram novas, aumentando o seu valor.
Por esta altura, penso como será voltar a fazer compras. Devo começar devagar? Agora, vejo com certeza a política de reparação de uma marca antes de comprar e examino regularmente o meu guarda-roupa. Anseio pela emoção de comprar uma peça nova (cuidadosamente escolhida), mas agora sei que a alegria de trazer de volta à vida uma peça favorita desgastada não é menos satisfatória.
Traduzido do original, disponível aqui.
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