Porque é humanamente impossível que o homem por trás d’A Criada Malcriada não arranje forma de contornar a finitude da vida, e se torne, como é apanágio dos grandes génios, imortal.
Porque é humanamente impossível que o homem por trás d’A Criada Malcriada não arranje forma de contornar a finitude da vida, e se torne, como é apanágio dos grandes génios, imortal.
Há coisas, mesmo que fugazes, que nunca se esquecem. O desfile de Alta-Costura primavera/verão 1998 da Dior, na altura comandada por John Galliano, foi, nas palavras de Tim Banks, “como a mistura de todas as drogas possíveis que alguém possa já ter experimentado, concentradas em dez minutos, e multiplicadas por mil.” O reputado crítico de Moda menciona esse momento sempre que lhe perguntam sobre o seu show favorito de todos os tempos.
Uma entrevista com Hugo van der Ding - escritor, apresentador de rádio e de televisão, autor da extinta página de Facebook Cavaca Para Presidenta, ex-membro dos Onda Choc, antigo tradutor de livros, inventor de um sem fim de personagens de banda desenhada, das quais sobressaem A Criada Malcriada ou Juliana Saavedra, A Psicanalista Que Deixa Os Pacientes Na Merda, atento observador da natureza humana, apreciador de insetos e da realeza, exímio reprodutor do grande incêndio de Londres, rebelde com causas publicáveis e outras que preferimos deixar de fora - é mais ou menos assim. Nunca se esquece, e é como mix um de todas substâncias ilegais que se possam provar, multiplicadas por mil. Ou dois mil, vá.
Numa tarde cinzenta de fevereiro, van der Ding (cujo nome real pode ser, ou não, Hugo Sousa Tavares) chega à redação da Vogue, agora despida de grande parte dos seus colaboradores devido às exigências do confinamento, como um raio de sol em ácidos. É praticamente impossível ficar indiferente à sua energia, à sua gargalhada, à sua boa disposição. E, acrescente-se, à sua inteligência, à sua generosidade, à sua humildade.
Uma hora de conversa não nos dá o direito de fazer uma avaliação da sua personalidade (Kurt Cobain, ao que parece, tinha uma ótima frase sobre isso). Porém, podemos afirmar que ficámos quase-amigos (ficámos, Hugo?), daí termos tomado a decisão de, pela primeira vez, tratar um entrevistado por tu. Tudo isto bastaria para o condenar à imortalidade, à semelhança dos protagonistas da sua rubrica Vamos Todos Morrer. Mas a fachada de gajo de 44 anos com pilhas de graça esconde alguém que tem muito mais para dar a este mundo (e ao outro). Nomeadamente, luz. Mais luz.
Este artigo continua na edição impressa da Vogue Portugal, nas bancas e na nossa loja online.