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Mulheres de abril

25 Apr 2024
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Artwork de Miguel Canhoto

No dia que marca os 50 anos do 25 de abril, a Vogue Portugal conta a história de 4 mulheres que lutaram pela liberdade em tempos onde esta não era um denominador comum.

Quando celebramos as Mulheres de abril, homenageamos aquelas que desafiaram a norma, lutaram pela liberdade e moldaram o curso da nossa história. Nomes como Maria Teresa Horta, Maria Lamas, Natália Correia e Maria de Lourdes Pintasilgo são, até aos dias de hoje, símbolos de uma luta coletiva pela liberdade e pelos direitos das mulheres.

Maria Teresa Horta

“Mulheres de Abril/somos/mãos unidas/certeza já acesa/em todas/nós/Juntas/formamos/fileiras/decididas/ninguém calará/a nossa/voz/Mulheres/de Abril/somos/mãos unidas/na construção/operária/do país/Nos ventres férteis/a vontade/erguida/de um Portugal/que o povo quis”

Maria Teresa Horta, Poesia Reunida (2009)

Jornalista, escritora e poetisa, Maria Teresa Horta, foi, desde cedo, uma figura associada à luta pelo direito das mulheres em Portugal durante a ditadura. Nasceu em Lisboa a 20 de maio de 1937, estudou jornalismo na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e foi nessa fase, que se dedicou ao cineclubismo, como dirigente do ABC Cineclube e integrou o grupo Poesia 61.

Em abril de 1972, Maria Teresa Horta, juntamente com Maria Isabel Barreno e Maria Velho da Costa, publicaram o livro Novas Cartas Portuguesas que revelava, entre outras coisas, a condição da mulher em Portugal. Foi censurado por ser considerado um livro “insanavelmente pornográfico e atentatório da moral pública”, com as três autoras a serem acusadas e levadas a julgamento. O caso intitulado de “três Marias” ganhou repercussão internacional com vários movimentos feministas em redor do mundo. A 7 de maio de 1974, o juiz Lopes Cardoso afirmou que “o livro Novas Cartas Portuguesas não é pornográfico nem imoral. Pelo contrário: é obra de arte, de elevado nível, na sequência de outras obras de arte que as autoras já produziram”. A obra tornou-se um símbolo e um marco inegável na luta pela liberdade, igualdade e direitos da mulher.

Publicou diversos textos em jornais como Diário de Lisboa, A Capital, República, O Século, Diário de Notícias e Jornal de Letras e Artes, tendo sido também chefe de redação da revista Mulheres. Publicou várias obras como Espelho Inicial, Minha Senhora de Mim ou, ainda mais tarde, As Luzes de Leonor.

Recebeu várias distinções de mérito, entre elas o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique pelo então Presidente da República Portuguesa, Jorge Sampaio, a 8 de março de 2004, e a 21 de abril de 2022, recebeu o grau de Grande-Oficial da Ordem da Liberdade. 

Maria Lamas

“Assim foi es­crito este livro, que é uma ex­pressão de fra­ternal so­li­da­ri­e­dade com as mu­lheres do meu País. (…) ví­timas mi­le­ná­rias de erros mi­le­ná­rios que, apesar de tudo, con­ti­nuam a ser as obreiras da vida…”

Maria Lamas, As mulheres do Meu País (1948 a 1950)

Uma das figuras mais incontornáveis do século XX. Maria Lamas foi escritora, tradutora, jornalista, ativista política, feminista portuguesa e defensora dos direitos humanos e da paz. Numa sociedade conservadora e tradicional, Maria Lamas lutou pelo direito ao divórcio e pela tutela das suas filhas com apenas 17 anos.

Foi uma das primeiras mulheres jornalistas profissionais e escreveu poemas, crónicas, novelas, folhetins, reportagens, recensões, romances, textos para crianças e adolescentes e textos sobre mulheres. As Mulheres do Meu País, publicado em fascículos entre 1948 e 1950, é a sua obra mais reconhecida e retrata a vida das mulheres portuguesas nos anos 40.

Humanista convicta, Maria Lamas lutou pela emancipação da mulher e destacou-se na política com ideias democráticas opositoras ao Estado Novo. Em 1945, tornou-se presidente da Direção do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, até ter sido proibida pelo governo. Nos anos seguintes continuou a desenvolver ideias contra o Estado Novo, o que a levou a ser perseguida e presa pela PIDE três vezes. De 1962 a 1969 esteve exilada em Paris, já com mais de 60 anos.

Após o 25 de abril de 1974 e com 80 anos, Maria Lamas foi eleita Presidente Honorária do Movimento Democrático das Mulheres, foi Diretora Honorária da Revista Modas e Bordados, e, mais tarde, da Revista Mulheres. Seis anos mais tarde foi homenageada com o Grau de Oficial da Ordem da Liberdade e, em 1983 recebeu a medalha Eugénie Cotton, da Fédération Démocratique Internacionale dês Femmes (FDIM). Morreu a 6 de dezembro de 1983, com 90 anos, em Lisboa.

Natália Correia

“A sabedoria é mesmo feminina. Correndo o risco de me repetir ou citar a mim mesma, direi que a «sophia» é feminina. A sabedoria é feminina e a filosofia é masculina. O homem enamora-se da sabedoria, mas nunca chega lá. E o percurso para... A mulher, ela própria, é ovularmente o segredo do Universo. Ela contém em si a sabedoria. Às vezes não tem é consciência disso.”

Natália Correia, Entrevista (1983)

Desde poeta, dramaturga, romancista, ensaísta, tradutora, jornalista, guionista e editora, Natália de Oliveira Correia foi uma personalidade de grande destaque na cultura portuguesa do século XX. Açoriana de raiz, nasceu em Fajã de Baixo, a 13 de Setembro de 1923, mas mudou-se para Lisboa com 11 anos, com a mãe e a irmã. Iniciou a sua vida como jornalista na Rádio Clube Português e colaborou com o jornal Sol. Na televisão fez alguns programas como Mátria no qual apresentava o lado matriarcal da sociedade portuguesa.

Como ativista política assumiu publicamente divergências com o Estado Novo e foi condenada a prisão com pena suspensa em 1966, pela publicação do livro Antologia da Poesia Portuguesa Erótica e Satírica. Para Filipa Martins, autora de O dever de deslumbrar: biografia de Natália Correia, a poeta foi "a autora mais censurada durante o Estado Novo".

Nos anos 50 e 60 a casa da poetisa funcionava como ponto de encontro de tertúlias intelectuais de Lisboa. Anos mais tarde, em 1971, foi uma das fundadoras do bar Botequim, que reunia várias pessoas de elite unidas pela oposição ao Estado Novo. 

Com toda a sua irreverência e carisma, Natália Correia sempre lutou para defender a cultura, o património e a integração e a emancipação da mulher na sociedade portuguesa. Morreu a 16 de março de 1993, com 69 anos, em Lisboa.

Maria de Lourdes Pintasilgo

“As mulheres devem insurgir-se contra a globalização selvagem e derrotar a hegemonia económica global, que só tem trazido maiores desigualdades”.

Maria de Lourdes Pintasilgo, Taizé, 5 de outubro de 2000

Maria de Lourdes Pintasilgo foi a primeira mulher a ocupar o cargo de Primeira-Ministra em Portugal. Nasceu em Abrantes em 1930 e, com 23 anos, licenciou-se em Engenharia Químico-industrial pelo Instituto Superior Técnico de Lisboa, onde apenas existiam quatro mulheres numa turma de 250 alunos. Desde cedo se interessou pela política e liderou associações e entidades ligadas a movimentos de mulheres ou estudantis. 

Em 1971 foi convidada a representar Portugal na Organização das Nações Unidas e, depois do 25 de abril, foi Secretária de Estado da Segurança Social do I Governo Provisório, em 1974, e Ministra dos Assuntos Sociais dos II e III Governos Provisórios, entre 1974 e 1975, onde também assumiu funções como Delegada Permanente de Portugal na UNESCO.

Em 1979 foi convidada pelo então Presidente da República, Ramalho Eanes, para o cargo de Primeiro-Ministro, função que ocupou durante meio ano. Seria ainda eleita deputada do Parlamento Europeu, a convite do PS, e candidata à Presidência da República em 1986. 

Assim como Maria Teresa Horta, Maria Lamas e Natália Correia, também Maria de Lourdes Pintasilgo deixou um marco na história até aos dias de hoje. Morreu a 10 de julho de 2004, com 74 anos, em Lisboa. 

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