Artigo adaptado do original, publicado em janeiro de 2022.
Com as Eleições Legislativas a acontecerem no próximo dia 10 de março, recordamos a história de que como as mulheres conquistaram o direito ao voto em Portugal.
Votar é um dever cívico. Votar é um direito pelo qual milhares lutaram. Votar é falar. Votar é dizer aquilo que queremos. Votar é escolher. No entanto, há por aí muita gente que não se mostra muito interessada em participar. Nas últimas Eleições Legislativas, que decorreram a 30 de janeiro de 2022, registou-se uma taxa de abstenção de 35%.
Agora que as próximas eleições estão à porta, com data marcada para o dia 10 de março, este é um bom momento para recordar a história de como as mulheres conquistaram o direito ao voto em Portugal. Uma história que importa ser contada as vezes que forem precisas, para que nunca nos esqueçamos daquilo que foi feito neste retângulo a que chamamos de casa.
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Carolina Beatriz Ângelo, a primeira mulher a votar em Portugal
Foi em 1911, um ano após ter sido implementada a I República, que aconteceu o primeiro ato eleitoral. Estavam aptos a votar “todos os cidadãos portugueses com mais de 21 anos, que soubessem ler e fossem chefes de família.” Não sendo referido o género, Carolina Ângelo, médica, viúva, com mais de 21 anos e uma filha menor ao seu cargo, dirigiu ao presidente da comissão recenseado do 2º Bairro de Lisboa um requerimento para que o seu nome fosse incluído.
A 28 de abril de 1911, o juiz João Baptista de Castro proferiu uma sentença histórica ao incluir o nome de Carolina Beatriz Ângelo no recenseamento editorial, dizendo: “Excluir a mulher (…) só por ser mulher (…) é simplesmente absurdo e iníquo e em oposição com as próprias ideias da democracia e justiça proclamadas pelo Partido Republicano. (…) Onde a lei não distingue, não pode o julgador distinguir (…) e mando que a reclamante seja incluída no recenseamento eleitoral.”
Um mês depois, a 28 de maio, Carolina Ângelo dirigiu-se às urnas e votou, sagrando-se a primeira mulher a fazê-lo em Portugal. Uma notícia que foi além fronteiras, sendo destaque no jornal inglês The Globe, que mencionou o distintivo utilizado pelas sufragistas portuguesas, o três cravos brancos. Mas foi sol de pouca dura, três anos depois seria aprovada uma legislação que especificava que somente os homens poderiam votar. Ao jornal Expresso, o historiador João Esteves referiu que Carolina era “apenas mais uma entre outras mulheres que pretendiam o voto, acreditavam na governação e aquelas palavras, sempre as palavras, seriam pouco depois postas à prova e contraditas pela prática política dos governantes.”
E a luta continuou
A convicção da médica ginecologista Carolina foi o ponto de partida para uma luta que durou duas décadas. Foi somente em 1931 que as mulheres conseguiram o direito ao voto, com limitações. Só estavam elegíveis as mulheres que tivessem frequentado o ensino superior ou as chamadas “chefes de família”, um termo que englobava “mulheres portuguesas, viúvas, divorciadas ou judicialmente separadas de pessoas e bens com família própria e as casas cujos maridos estejam ausentes nas colónias ou no estrangeiro.” E a luta continuou. Três anos depois, em 1933, a lei incluía o direito de voto à “mulher solteira, maior ou emancipada, quando de reconhecida idoneidade moral, que viva inteiramente sobre si e tenha a seu cargo ascendentes, descendentes ou colaterais.” Nesse mesmo ano, foi dada a oportunidade às mulheres de se candidatarem, tendo sido, em 1934, três mulheres eleitas para a Assembleia Nacional: Maria Guardiola, Domitília de Carvalho e Cândida Pereira.
Até que a descriminação sexual de voto fosse abolida foram precisos mais 34 anos. Em dezembro de 1968, com Marcello Caetano a chefiar o governo, o número de votantes foi alargado a todos aqueles que soubessem ler e escrever. Contudo, foi só depois do 25 de abril de 1975 que o direito ao voto se tornou universal em Portugal.
“Quando votamos, os nossos valores são postos em ação e as nossas vozes são ouvidas. A tua voz é um lembrete de que tu és importante e tens o direito de ser ouvida,” disse em tempos Meghan Markle. E votar é isto. É muito isto. O sofá pode esperar.
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