Beijos à chuva, bouquets rosas vermelhas dia sim, dia sim, serenatas sob a lua e um amor eterno à primeira vista. Será este amor possível?
Beijos à chuva, bouquets rosas vermelhas dia sim, dia sim, serenatas sob a lua e um amor eterno à primeira vista. Será este amor possível?
Claire Danes e Leonardo DiCaprio em Romeo + Juliet (1996) © 20th Century-Fox/Getty Images
Claire Danes e Leonardo DiCaprio em Romeo + Juliet (1996) © 20th Century-Fox/Getty Images
Estacionamos o carro, abrimos a porta e seguimos pela rua até à porta do cinema, compramos os bilhetes, escolhemos as pipocas, de preferência doces com topping de M&M’s - dos clássicos, obviamente - e entramos na sala. Em poucos minutos, depois do começo do filme, as personagens principais já estão apaixonadas, já juram amor eterno e inconscientemente já sabemos o final do filme: vão acabar juntos numa casa junto à praia e com filhos, dois cães e um gato. Saímos do cinema e repensamos sobre a nossa noção de relação ideal.
Os filmes românticos possuem a capacidade de criar no nosso inconsciente a ideia de um amor utópico que ultrapassa dez muros de Berlim e mantém-se de pé, um amor esculpido à medida das nossas necessidades, a ideia de que a outra pessoa nasceu para curar todas as nossas angústias.
Sou fã número um de comédias românticas, já vi milhares de vezes os mesmos filmes, sei de cor as falas e por vezes sei quantos minutos vai demorar até jurarem o tão típico amor eterno. Porém, sou o extremo oposto a uma romântica incurável. Sou o produto de um amor fraturado e, talvez por isso, nunca vi o amor, no sentido mais romântico, como a única bóia de salvamento possível no mar imprevisível que é a vida. Fun fact deste género cinematográfico é que a história nunca tem um fim, acaba sempre a meio, falta o acordar todos os dias ao lado da outra pessoa, falta as frustrações do dia a dia, falta o conhecer a outra pessoa por inteiro, os dias maus depois de um dia bom. Falta o quotidiano, o imperfeito e consequentemente falta a realidade de uma vida a dois. Falta descobrir o que aconteceu depois do sim.
Acredito que este amor idealizado coberto de rosas sem espinhos, com velas perfumadas e encontros românticos dia sim, dia sim, são a bomba de esperança do amor banal, do amor de todos os dias, da manhã à noite. O podermos sonhar com um ideal, por mais impossível que ele seja de alcançar. A ideia do para sempre, de um amor que nunca morre, uma chama que nunca desaparece, traz a ideia de que um relacionamento só é válido se for eterno, no entanto, a única coisa efémera no amor e na vida, é a memória e mesmo essa, por vezes, não perdura.
Se o amor de todos os dias estivesse em cena, será que ganharia um Óscar? Será que os gritos num dia mau ou o dormir de costas voltadas também mereciam uma lágrima? Ou pequenos gestos como fazer o pequeno-almoço quando a pessoa que amamos está atrasada para apanhar o metro mais perto de casa, também mereciam um sorriso? A beleza das coisas simples, das boas e das más, porque o amor é a forma humana do afeto, por mais idealizado que seja.
Alguém que baseia a sua perspetiva de uma relação saudável e “perfeita” - se é que existe uma relação perfeita - em valores transmitidos por filmes como Romeu e Julieta (1996) ou Diário da nossa Paixão (2004), conseguirá adaptar-se e moldar-se ao outro?
Apesar da visão irrealista e dos padrões inalcançáveis, os géneros românticos podem ser uma boa fuga da realidade e, hoje, são cada vez mais as produções que apostam em mostrar um lado mais real do amor. Contudo, o que muitos espectadores esquecem é que o filme é uma pequena parte da realidade, são peças de puzzle onde nós não vemos o final apenas o que nos é apresentado e este é um dos perigos deste tipo de filmes: fazer-nos acreditar que a metade é o todo, que o amor é tudo aquilo que é mostrado no cinema, que existem realmente pessoas perfeitas e ideais para cada um de nós, quando na verdade tal como a paixão, e as pessoas, existem diversas camadas que só descobrimos com o passar do tempo.